048 – Visita ao Museu Nacional & Almoço
São 11h e cheguei novamente ao Museu Nacional, no Forte de São Sebastião. Comi uma barra de cereais. Aqui no museu só me pediram 50 dobras no final. Eu nem sabia que se pagava, fiz a visita toda pensando que era grátis.
No interior do forte, o acervo do Museu Nacional inclui marcas da história e da cultura do país, dominado pelos colonos portugueses durante 500 anos. Um exemplo é esta sala de jantar de uma roça, simbolizando a forma como viviam os antigos patrões das plantações de cacau e café, base da economia são-tomense até à independência. A loiça e talheres apresentam o brasão da roça.¹
A Roça Boa Entrada, onde eu passei na crónica 41.
O Forte de São Sebastião foi construído no contexto de uma economia de plantação de cana-de-açúcar, entre 1566 e 1575, tendo sido consideravelmente reformulado em 1579. Foi ocupado pelos holandeses entre 1641 e 1648. No século XX foi adaptado para Comando de Defesa Marítima em 1960, e em 1975, finalmente, logo após a independência, foi metamorfoseado em museu nacional de São Tomé e Príncipe.²
Estes e muito mais detalhes podem ser vistos num documento do geógrafo João Sarmento, integrado nas “Actas do Colóquio Internacional São Tomé e Príncipe numa perspectiva interdisciplinar, diacrónica e sincrónica”, as quais que já citei na crónica 22, a propósito de outro tema. O link deste documento sobre o Forte de São Sebastião encontra-se na bibliografia no final desta página.
O farol foi construído em 1866.
Tinha que empoleirar-me no farol, pois claro. As próximas três fotos foram tiradas aqui de cima.
Andava eu entretida a fotografar tudo, quando aparece o Mayer. Pelo que percebi trabalha ali em baixo na roulotte. E a partir de agora vamos andar entretidos a tirar fotos. Eu mostro-lhe como quero as fotos, e tiro-lhe uma primeiro. Aproveito para regular os parâmetros da câmera. E depois o Mayer vê, e tira-me outra igual. Mas depois eu acabo por manter as fotos todas, está visto. Não apago nenhuma. Pelo que as fotos seguintes estão todas em duplicado 🙂
As marcas da floresta do Príncipe mantêm-se na minha perna.
Agora é o Mayer que caminha comigo pelas ruas de São Tomé, desta vez para mostrar-me onde fica um restaurante bom e barato, diz-me. Fui eu que lhe perguntei onde é que existe um. “No Parque da Cidade”, respondeu-me. E fez questão de acompanhar-me. Estes santomenses são uma simpatia. Aqui é a entrada do Parque, já depois de caminharmos dez minutos, e aqui nos despedimos. O restaurante fica ali à frente.
Pelo caminho contou-me que tem 22 anos e completou o 11º ano com média de 12. Precisa de ter média de 16 no 12º ano para ter direito a uma bolsa e entrar na universidade. O seu Facebook é Mayer Neto e tem amigos em Lisboa, Madeira, Açores, e uma série de outras localidades. Quer ir para Cascais tirar o curso de Hotelaria. E vive em São Nicolau, perto do museu Almada Negreiros, onde eu estive nas crónicas 37 e 39.
Escolhi bife com banana frita, 150 dobras (6€). É a segunda vez que como carne, em São Tomé e Príncipe. A primeira foi no Príncipe, no restaurante da Kita, onde comi entrecosto.
Na televisão passa uma sessão do parlamento de São Tomé, muitíssimo enfadonha, com os deputados a falarem em alto e bom som. É uma boa companhia num restaurante, sem dúvida.
É meio-dia. Tenho 27,5 km. O Mayer disse-me que não vou conseguir subir até Belém por causa da moleza depois de almoço. Até me fez rir. Efetivamente a subida é bastante íngreme e eu não gosto de exercício depois de almoço, com a barriga cheia, mas hoje eu subirei os 9 km a pé, calmamente, respondi-lhe.
Ficam todos surpreendidos quando eu digo que trouxe a bicicleta de Lisboa. O Mayer inclusive, naturalmente. Expliquei-lhe que veio desmontada e que tive aulas com um mecânico de bicicletas para aprender a desmontar e montar. Eles riem-se. O rapaz das pulseiras – o Leciley da Fonseca, da crónica de ontem – perguntou-me se eu não tinha ido a nenhuma oficina montar a bicicleta, quando cheguei a São Tomé. Eu respondi que não, que fiz tudo sozinha.
Esperem lá, que tenho aqui um cliente. Também chegaram mais pessoas, ficaram outras três mesas ocupadas por duas pessoas cada.
Mas este está bonito e bem tratadinho. Mesmo assim levou com uns bocadinhos de bife e banana frita. Comeu tudo, não se fez rogado.
Acho que o Mayer tinha razão. Eu consigo lá subir 9 km agora. De barriga cheia, com a moleza depois de almoço. São 13h06. Paguei no restaurante e andei devarinho aqui no parque, a ponderar no que fazer. Telefonar ao Fingui, o taxista cujo contacto me foi dado pelo Célio Santiago?
E eis que aparece o Mayke Jackson, o guia turístico do qual já falei na crónica 39. Surgiu de repente, inesperadamente. Está de passagem e parou para cumprimentar-me. Aproveitou e brincou com a minha bicicleta. Será que tem disponibilidade para levar-me a Belém?
Combinei com o Mayke levar-me ao hotel por cem dobras, na sua magnífica pickup. Efetivamente o Mayke ia ser o meu guia em São Tomé, e chegou a apresesentar-me um programa e preços, mas eu entretanto desisti de ter um carro de apoio, como é hábito noutras viagens minhas, pelo facto das ilhas serem pequenas e de eu querer poupar dinheiro. Depois de almoço, porém, apercebo-me que não gosto mesmo de pedalar. Já ontem não quis pedalar também e regressei de moto-táxi ao hotel. O Mayke sugere-me arranjar um chá de folhas de micocó para eu conseguir regressar sem ajuda de táxis, o que me fez soltar uma gargalhada. Pelos vistos o micocó é uma planta de São Tomé e Príncipe que dá energia.
São 13h30 e o Mayke deixa-me no resort, em Belém. Ainda conversámos um pouco: o Mayke falou-me de São Tomé e Príncipe, falou-me um pouco de si, sugeriu-me alguns destinos para eu fazer aqui na ilha. Diz que o “leve-leve” não irá durar sempre, que é preciso apostar no turismo, na pesca e na agricultura para desenvolver o país, que a mentalidade de ter muitos filhos para ajudar nem sempre é boa… O Mayke tem 21 irmãos pelo pai, que tem 5 mulheres. Tem irmãos em vários países, inclusive Portugal, França, Inglaterra. Nasceu em Agostinho Neto (lá chegarei, numa crónica futura), e agora sente pena ao ver tudo a ruir.
Recomendou-me Uba Budo, Roça Bombaim e Cascata Vale do Rio. Eu registei, para não me esquecer.
Apercebo-me que o tempo vai passar rapidamente e que eu tenho muitas coisas para ver.
Hoje fiz 29,2 km bicicleta, e 9 km de carro.
O telemóvel não falhou.
Fiz dois telefonemas ao Ju do museu de Morro Peixe, e ao Pajó da moto-táxi, para combinar o passeio de canoa amanhã, para avistar golfinhos e baleias. Está tudo ok, a canoa espera-me e o Pajó vem buscar-me às 5h30.
Ao final da tarde comi bananas, nozes, leite.
Finalmente tirei os pensos dos pés para tomar banho. Há 3 dias que não via as feridas. Já quase que não tenho nada, estão quase fechadas.
E falhei numa coisa, hoje: esqueci-me completamente de deixar o meu número de telefone à funcionária do Museu, para combinar o calulu com o Dimas e a sua família, no domingo.
¹ Ramusel, Graça (2018, 12 Novembro) “São Sebastião: A fortaleza que conta a história de São Tomé”. DW – Deutsche Welle. Página consultada a 3 Novembro 2019,
<https://www.dw.com/pt-002/s%C3%A3o-sebasti%C3%A3o-a-fortaleza-que-conta-a-hist%C3%B3ria-de-s%C3%A3o-tom%C3%A9/g-46225031>
² Sarmento, João (2012) “Paisagem e memória em São Tomé e Príncipe: o Forte de São Sebastião e Fernão Dias” in Actas do Colóquio Internacional São Tomé e Príncipe numa perspectiva interdisciplinar, diacrónica e sincrónica”, pp 433-453, Lisboa. Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), Centro de Estudos Africanos (CEA-IUL), ISBN: 978-989-732-089-7 Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT), ISBN: 978-989-742-002-3. Página consultada a 3 Novembro 2019,
<https://repositorio.iscte-iul.pt/bitstream/10071/3916/1/Sarmento_STP_305_315.pdf>