122 – De Bicicleta pelas Montanhas II
Café a secar ao sol. Sobre o café remeto para a crónica 120.
Algumas das cerejas já estão descascadas e no interior está então o grão do café.
Estou escondida a fazer xixi no meio dos arbustos e ouço passos atrás de mim. Sempre a virem na minha direção, titubeantes, a aproximarem-se cada vez mais. Apanhei um susto dos diabos. Mas quem é que vem na minha direção? Não posso fazer xixi descansada?
Para grande surpresa minha era este porco. Em vez de assustar-se e fugir, não. Veio bisbilhotar. Vai atacar-me ou quê? Posso ao menos terminar de fazer xixi ou tenho de ir a correr com os calções na mão?
Que coisa mais insólita. Que porco atrevido…
E depois com a pressa fiquei com uma palhinha na nádega. Subi os calções e vieram palhinhas agarradas, pelos vistos. A picarem-me de vez em quando. Estão a ver os cavalos a serem picados para acelerarem? Eu até acelerei na bicicleta, com as picadelas na nádega. A certa altura não aguentei mais, parei a bicicleta e meti a mão dentro dos calções a tentar descobrir o que está a picar-me desta maneira. A figura não é das melhores. Estava a um grupo curioso a olhar para mim. Também podias ter feito isto noutro local mais discreto, Rute. Não, teve ser na berma da estrada. E não encontrei nada. Pelo menos mantendo os calções vestidos não consegui encontrar nada. Só à noite, quando me despi para tomar banho, é que lá caiu a palhinha no chão.
Uma gigante cana de bambu!!
Lembro-me de falar dos “cavalos de vento” do simbolismo tibetano, para o qual a mente está montada numa energia ou vento interior. Esta energia é chamada de “cavalo de vento”. É a força deste cavalo de vento que determina se a nossa mente é dominada por forças negativas ou positivas. Neste momento o meu cavalo de vento leva-me pelas montanhas de Timor. É algo mais forte do que eu que está a impelir-me. Já estranho a minha própria voz ao responder “bom dia” a quem me cumprimenta. Sou eu? Sou eu que aqui vou?
Com o passar do tempo, e com a total imersão na realidade timorense, já não sou a mesma pessoa que era quando cá cheguei, no primeiro dia da viagem. Já estranho a minha própria voz.
Leva-me, cavalo de vento, leva-me pelas montanhas de Timor.
Uma alfarrobeira.
O estilo deste rapaz. Jeans desbotados slim fit. T-shirt da Levis. Uma fita com a bandeira de Portugal na cabeça. Todo este estilo é trabalhado, nada é por acaso…
E este garoto quis à viva força que eu o fotografasse. Pediu-me tanto para eu tirar-lhe uma foto. Eu nem sabia bem como tirar-lha, ele já tinha perdido a naturalidade (para eu o apanhar no seu dia-a-dia) e andava de volta de mim a pedir uma foto. Então fica aí com a minha bicicleta, disse-lhe eu. É pequenino ainda para montar esta bicicleta, teve de ficar em pé ao lado.
Bambu.
E agora entro numa “twilight zone”, com esta espécie de ninhos. Ainda não tinha visto isto em parte nenhuma de Timor, muito menos com esta abundância.
São fetos epífitos! Não são parasitas, nem são ninhos de pássaros. São fetos! Parecem secos pois no Verão é a estação seca e eles murcham. Estes fetos estabelecem uma “relação comensal” com a árvore, ou seja, vivem associados à árvore, retirando benefícios dela, mas não a prejudicando. Efetivamente as árvores estão vivas e saudáveis. Segundo a Wikipedia:
Epifitismo é a relação comensal entre duas plantas ou algas na qual uma (epífita) vive sobre a outra (forófito) utilizando-se apenas de apoio e sem dela retirar nutrientes e sem estabelecer contacto com o solo. O epifitismo é muito comum nas florestas tropicais.
O termo “epífito” foi cunhado em 1815 por C.F. Mirbel e vem da junção dos termos gregos epí (sobre) e phyto (planta), significando, portanto, “sobre planta”.
Em geral, as epífitas vicejam sobre o tronco das árvores, dispõem de raízes superficiais que se espalham pela casca e que absorvem a matéria orgânica em decomposição disponível. Muitas vezes, as raízes são acompanhadas por um fungo microscópico que faz uma associação mutualística conhecida como micorriza, que se encarrega de transformar a matéria orgânica morta em sais minerais, facilitando a sua absorção pela planta.
As epífitas jamais buscam alimento nos organismos hospedeiros. As suas raízes superficiais não absorvem a seiva da planta hospedeira, não há qualquer relação de parasitismo. Ou seja, a presença de epífitas não prejudica a árvore ou o arbusto onde elas vegetam. A incidência de espécies epífitas diminui à medida em que aumenta a distância para a Linha do Equador, ou afasta-se das florestas húmidas para áreas mais secas.¹
Continuo no distrito de Ermera, mas já saí do subdistrito de Atsabe e estou agora no subdistrito de Letefoho, e no suco Ducurai. (Sobre o significado de “suco” remeto para a crónica 78).
Suco Ducurai, subdistrito de Letefoho, distrito de Ermera.
¹ “Epifitismo” (s.d.). Wikipedia. Página consultada a 26 Fevereiro 2019,
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Epifitismo>