004 – Príncipe – Cinco e Meia da Manhã, Primeiro Reconhecimento

Acordei às 4 da manhã. A luz foi cortada poucos minutos depois. Cheira a petróleo e ouve-se um gerador. Os galos cantam.
Vai amanhecer às 5.30h. O pequeno-almoço é servido cerca das 8h. Garantidamente não vou ficar fechada no hotel até às 8h. Ponho o repelente de insetos no corpo (eu não pus o spray no quarto antes de deitar-me, mas felizmente não houve mosquitos esta noite), bebo mais um dos meus pacotes de leite com chocolate (trouxe 8) e às 5.30h vou fazer o primeiro reconhecimento da cidade, de bicicleta.

Aqui é a bonita marginal. Localizo-a no mapa, no fim desta crónica.

Estou a estrear uma câmera fotográfica nova. A anterior, que me acompanhou durante anos, avariou-se. Já não quis repará-la, já era altura de comprar uma máquina nova, com novas funcionalidades. Uma destas funcionalidades dar-me-á muito jeito: as selfies. Estas novas máquinas vêm bem preparadas para as célebres selfies. E são muito melhores do que um telemóvel, pois claro. Esta tira 9 selfies seguidas, e programo-a se quero a primeira selfie tirada em dez segundos, ou em vinte. Dá-me tempo de afastar-me, montar a bicicleta, e andar alguns metros, enquanto ela tira depois as 9 selfies de cinco em cinco segundos. Alguma há-de ficar bem. Também tem um écran amovível, ou seja, quando coloco a máquina no chão, antes deitava-me também no chão para ver no visor. Agora isso acabou: basta-me destacar e girar o écran amovível na direção que quero. Para cima, neste caso, dado que estou em pé. Estas tecnologias são mesmo fabulosas. Nesta foto deixei a máquina em cima do muro duma casa…  et voilà. Tenho 9 fotos seguidas a pedalar nesta estrada. Esta é a melhorzita. (E entretanto apaguei todas as outras). Mas quando há gente na rua normalmente eu peço às pessoas para me tirarem várias fotos. Vou ensinar muita gente a mexer nesta máquina – a função simples de espreitar no binóculo e clicar no obturador. Os santomenses tiram muitas fotos, mas com telemóvel. Normalmente não conhecem este tipo de máquinas.

Nesta viagem tirei 6.500 fotos. Apaguei logo muitas em São Tomé e Príncipe, num trabalho diário antes de deitar-me (que tive esta noite também, antes de adormecer). Voltei para Portugal com 3.660 fotos. E num segundo trabalho de limpeza, já em Lisboa, apaguei mais 500 e tal. Tenho 3.000 fotos agora, portanto. Nestas crónicas irei mostrar a maior parte delas.

São 6 e meia da manhã e tenho aqui o primeiro contacto com as lavadeiras do rio, ou neste caso da ribeira. O primeiro de muitos contactos. É um cenário comum em São Tomé e Príncipe. A maior parte das casas não tem água canalizada. As pessoas vão todos os dias buscar água aos chafarizes públicos, distribuídos amiúde por todo o país. Além do mais, a luz e a água canalizada faltam com frequência. Recordo que saí do hotel sem luz. Tinha água, porém. Mas quando regressar daqui a pouco, para o pequeno-almoço, já não haverá água também, além da luz. É o primeiro impacto e começo já a aperceber-me da dureza da vida destas pessoas.

Com roupa para lavar, a caminho da ribeira.

Estive 45 minutos aqui sentada, a ponto de já praticamente me ignorarem. Deixei a bicicleta na estrada presa com o cadeado e meti-me pelo caminho de terra, até aqui. Falámos um pouco, eu disse-lhes que venho de Portugal. Eu ainda estou a apalpar terreno, a conhecer tudo. Em breve saberei eu própria meter-me com estas pessoas, falar mais com elas. Ainda a sondar, eu própria estou um pouco calada. Não sei bem o que dizer ainda. Tudo é novo para mim, tudo me espanta ainda.
Mas ao fim dum mês em São Tomé e Príncipe eu voltarei bem diferente. É impossível não sair marcada por uma viagem assim.

A Marginal. Eu estou alojada a uns duzentos metros dela. Fui sempre rente ao mar até à ponte; e vi as lavadeiras algures naquela estrada com a seta amarela.

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