091 – No Mercado a Comer Espetada de Búzios do Mato

Fui-me embora da Roça Agostinho Neto às 11h, nessa altura com 25 km na bicicleta. Passei hora e meia lá. Tenho que ir agora ao mercado central de São Tomé buscar o dinheiro que o Célio Santiago mandou entregar-me, em troca da transferência bancária, conforme contei na crónica 87. A pessoa estará no mercado até às 14h. Tenho tempo, posso ir a pedalar e o caminho é quase sempre a direito.

A eterna confusão no “R”, dos santomenses. Carregam nos “R” e escrevem mesmo com duplo “R”! “Tapa-se furos” diz-se “Tapa-se Furros” e portanto escreve-se também assim 🙂

Ao fim de sete quilómetros a pedalar (são 11h45) esta camioneta está parada na berma da estrada a levar pessoas. Ah vai levar-me a mim também. E à bicicleta. A partir de agora há mais subidas e o trânsito intensifica-se, na entrada da capital. Vai levar-me, vai. “Também posso ir? – perguntei ao condutor do boné vermelho. Eu e a bicicleta!

Foram apenas 6 km, já estou na cidade. Chegámos às 12h05. Paguei 20 dobras (0,80€), 10 para mim, 10 para a bicicleta.

Tenho que encontrar a pessoa que vai entregar-me o dinheiro, no meio desta gente toda. Telefonei-lhe. Não percebo bem onde ele está. Passei o telefone a uma rapariga na rua. Ela conhece isto tudo, apontou-me a direção. Lá fui. Eu sou mais fácil de encontrar, terá de ser ele a localizar-me. Não há assim tantas brancas de bicicleta.

Cá está o meu contacto. Tem de dar-me 2.750 dobras (110€). Isto é o ordenado dum mês da função pública. Levámos algum tempo a contar as notas todas. Contámo-las discretamente no canto deste estabelecimento. Nem sei o que se vende aqui. Deixaram-nos estar. E fiquei com um grande maço de notas. Mil dobras pertencem ao taxista Adosindo, finalmente vou pagar-lhe.

Fui procurar a Maura, da crónica 55, para dizer-lhe que não consigo enviar-lhe a foto porque ela não tem WhatsApp. Perguntei por si a duas pessoas, uma delas pediu-me a sua foto, mas eu levaria muito tempo a encontrá-la na memória da máquina fotográfica. Outra chamou-a e afinal estava aqui mesmo, a meia dúzia de metros.

A Maura diz que não percebe nada destas coisas de WhatsApp. Rimo-nos as duas à gargalhada. Deixei-lhe o endereço do meu website escrito num cartão duma caixa, para um dia ela poder ver as fotos. Entretanto veio a polícia enxotar os vendedores e ela afastou-se. Só podem vender dentro do mercado, fora não. A Maura foi então para dentro do mercado com o alguidar do peixe. Eu fui atrás. Mas em poucos minutos voltarão todos para o mesmo sítio.

As vendedoras de peixe apalpam-me descaradamente os calções e a esponja. Atrás e à frente! No primeiro dia que aqui passei, chegada do Príncipe, fui tão maltratada logo na primeira foto que tirei. Agora já me aceitaram, já me conhecem, apalpam-me os calções, pedem-me fotos.

A Maura veio parar aqui e eu também, atrás de si. Espetadas de búzios, quem diria?! O Luís da Roça Agostinho Neto falou-me disto há pouco. Não é tarde nem é cedo, vou já provar isto.

Espetada de búzios do mato, 5 dobras. Muito picantes e rijos. Não são búzios do mar, são do mato! Eu apresentei os búzios do mato na crónica 38, aquando da visita ao Jardim Botânico do Bom Sucesso.

É hora de regressar a Belém e almoçar na Nelta. Este taxista pediu-me 30 dobras. Mas eu pago habitualmente 35, e disse-lhe que pagaria as 35. Agora já tenho dinheiro outra vez.

O melhor de tudo foi eu de capacete dentro do táxi – com mais 5 mulheres passageiras – e uns rapazes na rua a gozarem comigo por causa disso. Vai de capacete dentro do carro! Parecemos sardinhas enlatadas, o capacete na cabeça ocupa menos espaço, pá!!

Já estou no restaurante da Nelta, são 13h45, já troquei de roupa inclusivamente (os calções de ciclismo, com esponja, são demasiado quentes, parece que tenho uma fralda. Bem que mos apalparam no mercado). E o almoço é peixe fulofulo com fruta. Os santomenses não dizem “peixe com fruta-pão”, dizem apenas “peixe com fruta”. E não faço ideia que peixe é este. Nem sei se se escreve assim. Pelo menos diz-se. Fulo-fulo, talvez.
Está tudo pronto para o calulu amanhã, diz-me a Nelta. Amanhã vou provar esse célebre calulu!!

Às 14h30 estou de regresso à minha fresca mansão tropical. Fresca até demais, tenho de vestir uma camisola de manga comprida enquanto como a sobremesa. A Nelta quis dar-me outra carambola para sobremesa, mas desta vez recusei. Não posso comer fruta com casca, conforme ensinaram na consulta do viajante, e a carambola come-se com casca, é um desperdício eu ter de cortar a casca para poder comê-la. Perde-se metade do fruto.

Deixei as cascas da papaia no segundo local em que as galinhas as comeram. No primeiro local não comeram, as cascas secaram e ficaram lá. Vá-se lá entender a lógica das galinhas. Mas uma pessoa não discute com elas. Se elas comem a papaia nas traseiras da mansão, é lá que deixo as cascas. Na frente não gostam.
E também fui deixar pedaços de pão noutro local.

Efetivamente o galo veio com as galinhas, mas quando me viram com a máquina fotográfica na mão, assustaram-se e foram-se embora, já não comeram. É preciso um curso científico para conseguir dar de comer a estes animais.

Às 4 da tarde o tempo abriu e fez sol no resort. O vento abana as árvores.

A toalha branca desapareceu. Não está na casa de banho nem no estendal. No estendal só está a toalha das mãos e a minha camisola rosa, lavadas no tanque, com sabão azul, pela Virgínia. Hoje terei que dar outra toalha ao Abílio, mais pequena e fina.

Às 16h30 o Marcelo e o Raílson vieram perguntar como estou. Hoje estou mais tranquila, sem o stress da transferência bancária e do dinheiro, mas não posso ir brincar com vocês, disse-lhes eu. Ainda nem tratei das fotos e hoje tenho que deitar-me cedo. Amanhã tenho um percurso grande até Água Izé e ao almoço espera-me o calulu; tenho que sair cedo.

Às 17h40 chega o segurança Abílio. “Brancoé!” – chama-me ele, anunciando a sua chegada. De vez em quando chamam-me assim, aqui em São Tomé e Príncipe – brancoé, com o “o”aberto. Já não é a primeira vez.
Eu digo-lhe que fui a Agostinho Neto, ele diz que foi a Água Izé.

Às 19h, noite cerrada, adormeci.
Adeus, 26º dia da viagem. Foste um belo dia.

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