055 – Visita ao Mercado Central de São Tomé

É quase meio-dia. Vou agora conhecer o mercado, e aproveito para comprar uma jaca. Depois apanharei um táxi-partilhado (eu, a bicicleta e a jaca) até ao hotel.
À direita é a praça de táxis, à esquerda é o mercado.

A bicicleta fica presa neste poste, com o cadeado. Vejo é que o selim já está a dar o berro. É de gel, muito suave – não é o original da bicicleta, é outro que eu comprei para fazer esta viagem. Os miúdos acham-lhe muita graça e apalpam-no. Aqueles dedinhos inquisitórios não devem ajudar à festa. Cada viagem que faço, estraga-se um selim. No ano passado foi em Timor, também foi um selim ao ar. E agora vai ser este. Estes selins de gel são muito suaves, bons para viagens longas, mas estragam-se facilmente. Bom, mas as minhas partes pudibundas agradecem. É unissexo, este selim. Aquele buraco ao meio é para as partes pudibundas masculinas.

Comecei a perguntar os nomes às pessoas. Atenção – deixo a nota – de que não é fácil fotografar abertamente no mercado. Os vendedores não gostam. No primeiro dia, quando cheguei e quis fotografar as bananas, recusaram-me. Entretanto, hoje já é o sexto dia em que estou na ilha de São Tomé, nesta viagem tão particular, de bicicleta, em que passo por toda a gente, e cumprimento sempre. Já todos começam a conhecer-me. E deixaram-me fotografar, e eu comecei a anotar alguns nomes inclusivamente. Também me fazem perguntas, nomeadamente de onde sou. De Lisboa!, respondo.
Esta vendedora de peixe chama-se Idalita Manuel, e tem família em Lisboa, conta-me.

Aqui temos a Feliciana Ramos, que vende legumes. Tem família em Coimbra. Mora em Santo António. Eu tentei lembrar-me onde fica Santo António, no mapa. Perguntei se é perto de Madalena; a Feliciana soltou uma gargalhada e disse que é na outra direção. Estou mesmo perdida. Mas eu estou a confundir com a povoação António Soares, por onde já passei a caminho da Roça Boa Entrada (na zona de Madalena).

Aqui é uma vendedora de carvão, e no meio da azáfama e das conversas entre as três, não registei o seu nome, nem das pessoas a seguir. Começa a ser muito animado, muita algazarra, em breve chamar-me-ão mesmo para tirar fotos, e eu já não consigo dar conta do recado e anotar os nomes de toda a gente.

Este vendedor de peixe está tristonho e eu perguntei-lhe se tem a paciência de sorrir para uma foto. Ele respondeu-me que a mulher morreu recentemente, que não tem ânimo. Lamentei o sucedido. Veio esta sua amiga, que estava a ouvir a nossa conversa, para animá-lo e colocou-se ao seu lado, para a foto.

A Maura, à esquerda, chamou-me para tirar fotos. Fiquei de enviar-lhas, ela diz-me que tem WhatsApp. Mas quando tentei, afinal não tem. Posteriormente, quando eu chegar ao hotel e começar a ver as fotos e tentar enviar-lhas, far-lhe-ei um toque para ela ligar-me de volta e tentarmos resolver isto. Não quero que ela fique aborrecida pensando que me comprometi as enviar as fotos, e agora não envio.

Perguntei a ele se vai ficar sempre sério nas fotos, se não quer sorrir. Todos se divertem e ele responde “Homem não se ri!”, o que ainda dá azo a mais gargalhadas entre nós todos. E ficou sério nas fotos, se bem que aqui já a ceder.

No meio desta confusão e algazarra, ligou-me o guia Monuna, do Príncipe (crónica 31). Disse-me que foi uma sorte termos ido ao Pico do Príncipe naquele domingo, pois não tem parado de chover desde então. Eu respondi-lhe que ainda não apanhei chuva desde que cheguei a São Tomé!

Vou comprar aqui uma jaca madura por 20 dobras, o preço normal delas, como me ensinou o Ismael (na crónica 41).

E chegou a hora de regressar a Belém. Este taxista chama-se Quiando, mas também diz ser Leandro. Não é ele que vai levar-me, é um colega seu, mas enquanto o táxi enche e não enche (temos de ser 5 passageiros para o carro partir) foi um grande alarido com ele e com os colegas, todos a troçarem: o Quiando quer à força casar-se com uma europeia, dizem eles, e insistem que ele tem é de casar com uma santomense. “E eu tenho marido!”, esclareço eu (não tenho marido coisíssima nenhuma, tenho namorado, mas eu nem quero entrar em detalhes… Parece-me que um marido será mais convincente do que um namorado…). Mas eles respondem prontamente que não preciso de ser eu, pode ser uma amiga ou uma prima!
Foi uma algazarra de conversas e risos.

O Quiando indica-me que me leva a Porto Alegre, no extremo sul da ilha, ida e volta 1.000 dobras (40€). Os taxistas dizem que é difícil apanhar um táxi de lá para cá; existem 3 ou 4 a fazer esse serviço, mas só fazem uma viagem. Levam 125 dobras por pessoa por serem partilhados. São carrinhas, não são carros.
O Quiando deixou-me então o seu número, e eu fiz-lhe um toque para ele ficar com o meu. Mas deu-me um 9 a mais, pelo que paguei 1,26 dobras pela chamada que foi parar a outro lado. Ele estava com o telemóvel na mão e não tocava. Então optei por deixar-lhe o meu número e foi ele que ligou, mas eu entretanto parti no táxi e desta vez fui esborrachada, colada à porta, com outras 4 pessoas atrás e mais uma criança, pelo que nem me mexi para tirar o telemóvel da bolsa, deixei-o tocar.

Foi este o taxista que me trouxe. O passageiro ao meu lado saiu ao fim de 4 ou 5 minutos de viagem, e eu saí juntamente com o último rapaz no cruzamento de Belém, 2 ou 3 minutos depois. São viagens muito curtas. Fiz o resto na bicicleta, talvez uns 300 metros a descer.

Eu e a minha jaca, de chegada ao resort. São 13h15. Hoje fiz 30,5 km na bicicleta e 23 km nos dois táxis (de Micoló para a cidade, e desta para Belém).
A jaca tem um cheiro intenso, doce, que me enche o quarto. Nem vou conseguir tê-la muito tempo no quarto, vai já para a cozinha.

Quando abri as janelas do quarto, o galo andava a espreitar. Fugiu com as duas galinhas mal eu peguei na máquina fotográfica. Atirei bocadinhos de casca das bananas. Pouco depois andavam a cacarejar à porta do meu quarto. Mas não gostam das cascas, não comeram.
Às 13h30 chuvisca. Foi coisa rápida. Fazem uns 25 graus, talvez. À noite já visto três camisolas.
O Célio Santiago estava a sair quando eu cheguei, ia a Agostinho Neto. Eu podia aproveitar a sua boleia de carro, mas não quis ir. É domingo, há muita gente, agora vou descansar no silencioso resort. Se bem que a música em altos berros continue algures ao lado do resort, o que quebra o sossego.
A Virgínia já veio lavar a louça e despejar os lixos. Fez a minha cama de lavado pela segunda vez desde que aqui estou. Se era uma pulga, o que me picou hoje durante a noite (crónica 53) pelo menos já estão mudados os lençóis.

O Célio Santiago trouxe uma carrada de bananas-maçã. Eu ainda tenho as minhas, do Morro Peixe, e agora tenho uma jaca perfumada também. Em Timor e na China tive receio de comer fruta, agora em São Tomé vingo-me.

Às 5 da tarde fui lanchar a jaca, com umas bolachas e leite. A jaca tem muita cola, fiquei com dedos, lábios e nariz todos colados. Limpei com um guardanapo – rasgou-se todo e ficou colado aos meus lábios. Foi muito difícil descolar o guardanapo da boca. (O que é ridículo… eu com um guardanapo colado com a forma dos lábios… parecia um baton branco). Quando me inclinei para a frente e os cabelos caíram para a cara, ficaram colados na boca. Será que não fiz algo bem? Vejo as pessoas a comprarem e comerem logo na rua. Eu abri a jaca como o Ismael fez anteontem. E fui comendo à dentada, como vejo fazer, e como fiz anteontem. Não fiquei colada anteontem. A cola é fortíssima. Fez fios tipo queijo. Na faca, na boca. Tive que lavar a boca com água (não saiu) e ir limpando com uma toalha. No lixo fechei os restos dentro dum saco porque é mosquitos por todo o lado à sua volta. Comi um quarto apenas, pus o resto no frigorífico. A faca teve de ficar dentro dum prato com água, pois não consegui tirar-lhe a cola.
No dia seguinte vou dizer ao Célio que pode ficar com a jaca, que pode dá-la à Virgínia, se quiser, pois eu não quero mais.

Enquanto comi a jaca, na sala, pulverizei o quarto com o spray anti-mosquitos. A ver se tenho uma noite mais descansada, hoje.

Não há wifi. Sempre que o Célio não está, aparentemente não há wifi. Preciso para fazer backup das fotos na cloud. O Célio disse que chegaria cerca das 21h. Mas esta noite dormi sozinha com tudo aberto. Se não levam a sua bicicleta de carbono, também não hão-de querer a minha. Já nem digo fazer-me mal. Eu disse que não me importarei de dormir sozinha no resort, com o guarda lá fora, e que o Célio pode ir para casa. Mas este respondeu-me que o guarda não lhe deu a certeza se vinha, portanto virá o Célio. É que eu ando com horários radicais, de deitar cedo e cedo erguer, pelo que com certeza atrofia a vida ao Célio Santiago, que tem de ficar em silêncio bem cedo. Anteontem acordei com a televisão ligada às 10 da noite em altos berros; a essa hora fui pedir-lhe para baixar o som. Era a final da copa africana, Senegal-Argélia, e o Célio entusiasmou-se. Ainda bem que não há mais hóspedes no resort, senão eu estaria tramada, com a vida estranha que ando a levar nestes dias. E os outros hóspedes também acordariam às 4 da manhã com o cheiro a ovos estrelados. Provavelmente eu mudaria os meus horários um pouco, para adaptar-me. De qualquer forma no Príncipe estive numa residencial com vários hóspedes e nunca fui incomodada. E saí sempre em silêncio, não acordei ninguém, supostamente.

Entretanto enviei um email ao diving center de São Tomé, e combinei ir mergulhar com garrafa de ar comprimido depois de amanhã. Iremos para a Lagoa Azul, disseram-me. Eu disse que estarei lá de bicicleta às 7h30, eles passaram para as 8h30.

Às 19h o sono apodera-se de mim.
Bye-bye. Foi um dia magnífico.

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