083 – A Chover… Acolhida numa Casa do Oecusse
O Búfalo dos Pântanos (Bubalus bubalis carabanensis), ou em tétum, “karau”. (Ver a crónica 15 para mais detalhes sobre este búfalo).
E o céu está a ficar cada vez mais negro.
Eu vou a passar na estrada, junto destas casas, e respondi aos gritos das crianças: “Malai! Malai!” (ou seja, “estrangeira”).
Olhem, esta malai gostava de ir conhecer a vossa casa e descansar aí um bocadinho convosco…
E olhei para dentro da cerca. As casinhas tão bonitas ali a chamarem por mim. Será que me deixam entrar?
E entrei mesmo. Convidaram-me para entrar e ainda me ajudaram a levar a bicicleta.
Esta é a casa do José e da mãe Teresina – ambos em primeiro plano na foto. O José tem casa em Díli, está duas semanas de férias e veio visitar a mãe, explicou-me. Aqui no Oecusse falam baiqueno e pouco tétum, mas usam o tétum sempre que se dirigem a alguém de fora. O José e a Teresina não falam português. Fomo-nos entendendo por palavras aqui e ali, que serão parecidas em tétum e em português.
Claro que não estava tanta gente dentro desta casa, mas com a minha visita inesperada, vieram todos espreitar. Entretanto começou a chover. Fiquei sentada um pouco, junto da D. Teresina, enquanto os miúdos se riam, divertidos. O José permaneceu em pé. Eles dizem-me que eu sou bonita. Eu rio-me e agradeço. O José diz-me que esta casa não é bonita. Eu acho-a bonita, é uma casa tradicional do campo. Pelos vistos o José deve ter uma casa em Díli que achará mais bonita. E ensinam-me a dizer “chuva” em tétum. Ou se calhar é em baiqueno, não sei: diz-se “udan”.
O Valério já deve andar à minha procura, ainda por cima a chover. Eu expliquei-lhes isto, e eles perceberam. Há um Valério a conduzir um carro, que há-de vir à minha procura certamente. E eis que ouço um carro a aproximar-se. Levantei-me rapidamente e espreitei à porta. É mesmo o Valério, que voltou para trás. Claro que nem me vê; eu dei um berro e chamei-o. A pickup parou. E o Valério viu-me, à porta da cabana, a fazer-lhe adeus. Continua a chover.
O Sr. José ajudou-me novamente a levar a bicicleta, desta vez para a pickup. Parece que não, mas está a chover, e com pingas gordas. Pelos vistos ele não quer saber da chuva, com esta descontração toda.
Esta foto já foi tirada pelo Valério, rapidamente, com a máquina à chuva.
Entretanto parou de chover. O Valério estava preocupado por atravessar esta ribeira. Contou-me que morreram aqui alguns membros das Nações Unidas, mais exatamente seis coreanos, há uns anos atrás. Houve umas grandes enxurradas que arrastaram os carros. Os corpos nunca foram encontrados e acabaram por serem dados como desaparecidos. Bom, mas a chuva hoje será significativamente bem mais moderada, pois nem encheu isto de água, para azar destas pessoas, que assim não apanham camarão – estas pessoas vêm apanhar camarão. E pediram-nos boleia – se podemos levá-las no tabuleiro da pickup. Então vamos lá. Eu por enquanto vou ao lado do Valério, e no banco de trás vão o Sanches e o Ego, o guia local que nos acompanha hoje.
As pessoas a regressarem às suas aldeias, com as redes para apanhar camarão.
A partir daqui passo novamente para a bicicleta. Já parou de chover e não há ameaça de voltar a chuva. As pessoas prosseguem na pickup, de boleia.
Chegada à entrada da cidade de Pante Macassar, onde pelos vistos todos me aguardam, não é só o Valério! E observam com muita atenção tudo o que faço. Tirei os óculos, as luvas, o capacete, tirei o elástico do cabelo e soltei-o. Quando termino o passeio de bicicleta faço sempre isto – solto o cabelo. Estas pessoas não despegaram o olhar de tudo o que fiz, curiosas, ali a centímetros de mim. Haja descontração. Eu ri-me para elas, elas riram-se também.