058 – 13º Dia, de Barco para a Ilha de Ataúro
O despertador ficou para as 5.45h, mas eu acordei 5 minutos antes. Está a melhorar, ao menos já não acordo às 4 e meia da manhã ou às cinco. O barco para Ataúro é às 7.30h. Vêm buscar-me às 7.15h. Isto é que é rapidez, mas com estas questões nem me preocupo, é a Timor MEGAtours que trata de tudo. Se eles dizem que é assim, é porque é assim. Efetivamente virei a descobrir que os barcos em Timor não são assim tão certos. Às 7.30h o barco já lá está, sim, mas ainda está a descarregar antes dos passageiros entrarem. Iremos partir já perto das 8.30h. Não há horários rígidos, o tráfego marítimo em Timor não o justifica, pelos vistos. Quando sair, sai. E se não houver passageiros suficientes, nem sai. Ora toma.
E entretanto cumpri a minha rotina habitual do protetor solar e do repelente de insetos. Ficaram de trazer-me pão quente às 6.15h, para o matabicho (entenda-se: “pequeno-almoço” em tétum), mas o pão não apareceu. Algum bicho o comeu, antes de eu o matar. (Isto é a barriga a dar horas, não sai melhor do que isto). Bom, não há problema, já sei que as coisas em Timor nem sempre são certas, é preciso é descontração. Ataquei os meus cereais de chocolate, com dois pacotes de leite com chocolate. E antes disso muita água, para hidratar logo de manhã. Faz calor, está-se bem. Díli é quentinho, felizmente. Acho que fiquei traumatizada com o frio de ontem, no Ramelau.
O Valério veio buscar-me na pickup e partimos às 7.10h. O porto é mesmo aqui ao lado. Eu levo apenas a mochila comigo, com as coisas para uma noite. A mala grande ficou no apartamento. E agora à saída é que entregaram o pão quente ao Valério. Ora muito bem.
O navio veio do Oecusse (lá chegarei, nos próximos dias). Partiu às 5 da manhã, e chegou a Díli às 5 da manhã também, disseram-me. Será verdade? Um dia inteiro para fazer uma viagem tão curta. Isto promete. Havia outro barco para o Oecusse que levava apenas três horas, contaram-me, mas avariou-se e foi para a Malásia para reparação. Já lá vai um ano. O meu bilhete tem escrito “5 dólares”. Presumo que tenha custado 5 dólares, foi a Timor MEGAtours quem tratou de tudo. Disseram-me posteriormente que se a viagem fosse feita num sábado o bilhete custaria 45 dólares. Hoje é 5ª feira.
Tradução do tétum: “Vem usar um fogão novo”. O camião tem os logotipos da GEF – Global Environment Facility (ou em português “Fundo Mundial para o Ambiente”), um organismo financeiro que oferece subsídios para projetos relacionados com a biodiversidade, mudanças climáticas, degradação do solo, entre outros. A meio está o logotipo da RDTL – República Democrática de Timor-Leste. E finalmente o logotipo da UNDP – United Nations Development Programme (ou em português “Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) órgão das Nações Unidas que tem por objetivo promover o desenvolvimento e erradicar a pobreza no mundo, e um dos parceiros da GEF na implementação dos seus projetos.
Este camião vai para Ataúro no mesmo barco que eu. Irá distribuir fogões a lenha pela população, supostamente.
O Valério vai-se embora. Eu já estou dentro do navio e tenho um novo guia, que se chama Natalino e o qual irei apresentar na sessão fotográfica da próxima crónica. Levamos duas bicicletas connosco, a minha suplente será usada pelo Natalino. N’a pas de pickup, agora. Temos que desenrascar-nos só com as bicicletas, em Ataúro. (Olha que maravilha).
As máscaras na cara são um hábito asiático, atrevo-me a dizer assim tão claramente, sem dúvidas. Não vemos isto em África, na América Latina (ou do Norte), na Austrália, na Europa – em mais lado nenhum. Tendo viajado pelo Vietname e pela China, onde são usadas com frequência, e tendo também viajado por todos os continentes nomeados acima, é aqui na Ásia que vejo as pessoas usarem máscaras na cara – sem estarem doentes, entenda-se. Na Índia não se usa também. Estive na Índia, no norte e no sul, e não vi ninguém usar máscaras. No Vietname e na China o objetivo é evitar o sol, ou mais exatamente o bronzear do sol. As pessoas usam inclusivamente luvas e meias opacas, para evitar o contacto com o sol. A pele clara é apreciada nesses países. Aqui em Timor o objetivo é outro, pelo que me informaram: evitar os maus cheiros do navio e as bactérias. São os meninos da cidade, universitários, com quem virei a falar daqui a pouco. Não podem cheirar o cheiro das cabras e dos porcos transportados no navio. Ai deles que experimentem tamanho horror… E a sujidade é muita, podem ficar contaminados. Eu estou aqui a vender saúde, venho da Europa, e durante esta viagem a Timor já comi em restaurantes mais sujos do que este barco (e fotografei-os para que não existam dúvidas). Mas os meninos timorenses universitários da cidade… jamais.
É assim a vida.
Pergunto-me se teríamos Timor-Leste hoje, se a Indonésia ocupasse o território nestes tempos. Se os meninos universitários estariam dispostos a lutar nas montanhas, sujos e lamacentos, pela sua pátria.