083 – A Primeira Comunhão
Este cão brinca, contente. Alguém aqui em Trindade trata-o bem.
Eu estou sentada na berma da estrada e limito-me a fotografar quem passa à minha frente. Há um desfile de carros que vem deixar as pessoas aqui neste ponto. Outras chegam a pé.
“Grupo de Ação Social do Tagus” – leio nas suas tshirts. A pick-up veio deixá-los aqui também. Leio na Wikipedia que se trata duma organização não governamental para o desenvolvimento (ONGD) portuguesa, a qual visa alertar e incentivar a juventude para a descoberta e promoção da dignidade humana através de ações de voluntariado em Portugal e países lusófonos. Estão presentes – além de Portugal e São Tomé e Príncipe – em Angola, Brasil, Cabo Verde e Moçambique. A fundação do GASTagus teve como principal motivador a não existência de organizações laicas que preparassem voluntários para projetos internacionais de curta duração (1 a 3 meses). O GASTagus está sediado no pólo do Taguspark do Instituto Superior Técnico. Foi fundado em 2008 por dois jovens universitários, Nuno Amarante e Nuno Cruz. Os dois eram antigos voluntários da Irmãs Doroteias, e quiseram oferecer a experiência de voluntariado internacional a um público universitário mais alargado, sendo que a questão da religião poderia afastar pessoas da experiência.¹
Estão tão verdinhos, os meus meninos de Portugal. Universitários. Chegam numa grande pick-up, escoltados por dois santomenses, ainda não sabem vir sozinhos. Conversam e riem em grupo, não se misturam, não se separam. Estão a aprender. Quiçá virão a tornar-se no futuro em termos de ajuda e cooperação internacional. Estão a dar os primeiros passos titubeantes.
Ali à direita vem o que creio ser um sem-abrigo. Não sei. Existirá a categoria de “sem-abrigo” em São Tomé e Príncipe, onde toda a gente terá uma cabana? Ele vai deambular para trás e para a frente, aqui em frente a esta casa onde vai ser dada a missa. A igreja é demasiado pequena, a missa tem de ser dada aqui. E as suas calças estão rasgadas e a cair, pelo que ele anda com as partes pudibundas praticamente à vista. Se calhar é louco.
A minha bicicleta está presa ali ao poste, à esquerda.
Eu arranjei um banquinho, com uma pata partida, pelo que tinha de estar muito quieta, sob pena de cair (nem quero imaginar o espalhafato se isso acontecesse), e fiquei aqui sentada, na porta da frente, a ver e ouvir o sermão.
O padre contou-nos logo uma história, no início:
– O que é a primeira comunhão? – perguntou ele às crianças há uns dias atrás, em preparação para este evento.
– É receber Cristo vivo através da consagração da hóstia – responderam alguns, e bem.
– E o que consagra a hóstia?
Esta pergunta tê-los-á atrapalhado. Hoje já sabem que quem consagra a hóstia é o padre. Mas há uns dias atrás ainda não sabiam.
– Somos nós, as crianças – terão respondido.
– Tenho concorrência?!… – contou-nos o padre. Riso geral na plateia.
O padre perguntou: “O que é o Pai?”. E acrescentou: “Não é o pai que está lá em casa, e que tem várias mulheres e filhos por todo o lado”.
Toma!…
São agora 11h03. Assisti a quase uma hora de missa, e saí agora, discretamente.
Ainda na cidade de Trindade, aqui é o Salão do Reino das Testemunhas de Jeová.
Já na estrada a caminho de Belém. Aqui é a Igreja Pentecostal.
“GASTagus” (s.d.) Wikipedia. Página consultada a 5 janeiro 2020,
<https://pt.wikipedia.org/wiki/GASTagus>