14 – Os Edifícios Negros & os Vampiros

Pontos negativos. Também os há, naturalmente.

Primeiro. Os portuenses pintam as casas de preto. Estranho.
Mas não, não. Não é verdade. Aproximando-nos um pouco mais, com o nariz junto à parede, apercebemo-nos que é sujidade mesmo. As fachadas estão pretas de sujidade. Edifícios lindos, antigos. E pretos. Ao entardecer, no lusco fusco da tarde, quando o sol já se foi mas a noite ainda não veio, só falta aparecer um vampiro nas suas sombras tenebrosas para morder-nos o pescoço.

Avenida Mouzinho da Silveira. Nos fones do autocarro turístico, de dois andares, foi-nos apresentada a avenida como sendo uma das principais na cidade, e assim o é. Em direção à Estação de São Bento, quem sobe, cheia de trânsito, cheia de gente. E enquanto ouvíamos este comentário, entre outros, fixámos o prédio que nesse momento – a meio da avenida – se encontrava à nossa frente. Preto, e para agravar com buracos pretos também. As janelas partidas, escancaradas, à mercê da chuva e do vento. Quais olhos furados, cegos. Abandonado.
Bom. Se isto é na avenida principal, o que fará nas outras mais escondidas e não turísticas.

Sempre ouvi comentários sobre o Porto ser uma cidade escura. E sempre me intrigaram, esses comentários. Então mas o sol não bate nas casas? E assim fui ver com os meus próprios olhos. Não concordei – o Porto é uma cidade linda e brilhante. Mas percebi o que queriam dizer aqueles comentários. Parciais, sem dúvida, mas percebi-os e há que tomar medidas para resolver isto de vez. Acabem com os olhos cegos dos prédios, com os buracos furados, limpem as fachadas dos edifícios, alguns centenários, e a coisa muda de figura. Disseram-me até que há dez anos era pior. É porque está a evoluir alguma coisa. Sejamos optimistas, com tempo vai.

Terceiro ponto negativo (o primeiro são os edifícios pretos, o segundo são os abandonados):
Não sei onde se metem os portuenses à noite, mas as ruas ficam desertas a partir das 8, é incrível. Será que a malta vai fechar-se em casa a ver televisão?… Na primeira noite que lá estive (ainda inocente e imaculada…) desci do hotel até à Ribeira, a pé, precisamente entre as 20 e as 21h. Enfim, não repeti a proeza no resto da semana. Que desalento, meus amigos… Apenas os desgraçados dos sem abrigo a abordarem-me pedindo moedas. Para onde é que foram todos? E o tempo estava óptimo – dias e noites bem quentes (tive uma grande sorte – choveu na semana anterior e na semana seguinte à minha ida. Na semana em que lá estive fez um sol estrondoso que até me deixou com as marcas das sandálias nos pés, e os óculos escuros acabei por tirá-los, a muito custo, porque já estava com uma faixa branca nos olhos…).
Achei graça ao que o guia que nos levou a Guimarães e Braga nos disse e então compreendi que é mesmo uma característica do Porto e das gentes do Porto:
Braga reza. Coimbra estuda. O Porto trabalha. E Lisboa diverte-se.
Ora bem. As gentes do Porto vão para casa bem cedinho. Ainda hoje, Domingo à noite (é quando estou a escrever esta parte…) cheguei já passava das dez da noite, a casa. E vim a pé. Fiz meia hora a pé. E estava uma noite fria que me fez vir de braços cruzados para aquecer. E havia uma multidão na rua, para trás e para a frente, para cima e para baixo. Gente a circular. A comparação com o Porto é evidente. Isto com uma noite fria e quase chuvosa…. Lisboetas foliões!

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