119 – Visita ao Forte Jaigarh & Feticídio Feminino
Regressemos ao papel da mulher na Índia, e mais precisamente às crianças do sexo feminino.
Com tudo o que foi exposto nas últimas crónicas, sendo as raparigas um fardo económico e também social para a família – através sobretudo do dote mas também pelas prescrições culturais quanto ao seu comportamento sexual, prescrições essas que não existem para os rapazes (pelo contrário, os rapazes são incentivados a obter experiência sexual antes do casamento), o seu nascimento muitas vezes é algo não desejado. E isto leva-nos a outro tema melindroso: o do infanticídio e do feticídio.
No relatório de 2007 da UNICEF sobre a “Situação Mundial da Infância”, é dito:
A discriminação de género começa cedo. Modernos instrumentos de diagnóstico para a gestação tornaram possível determinar o sexo do bebé logo no início. Nos locais em que há uma evidente preferência económica ou cultural por filhos homens, o mau uso dessas técnicas pode facilitar o feticídio feminino. Embora não haja evidências conclusivas para confirmar esse mau uso ilegal, histórias sobre nascimentos e dados de recenseamentos na Ásia – principalmente na China e na Índia – revelam uma proporção excecionalmente alta de nascimentos de meninos, assim como de meninos com menos de 5 anos de idade. Essa constatação sugere a ocorrência de feticídio e infanticídio seletivos por sexo nos dois países mais populosos do mundo – apesar das iniciativas para erradicar essas práticas em ambos.¹
Palavras eufemísticas, estas da UNICEF: “Embora não haja evidências conclusivas para confirmar esse mau uso ilegal”. As evidências e as provas são de tal ordem que o próprio governo indiano ilegalizou os dotes e emitiu uma lei proibindo os médicos de revelarem qual o sexo do bebé antes do nascimento. Veja-se esta notícia:
Médico condenado na Índia por divulgar sexo de bebé
Um médico e a sua ajudante foram condenados a dois anos de prisão na Índia por realizarem testes de determinação do sexo dos bebés antes do nascimento. É a primeira vez que um tribunal condena alguém por esta prática, num país onde é proibida pela legislação.
Anil Sabhani e Katar Singh foram acusados de ter violado a Lei de Técnicas de Diagnóstico Pré-Natal. Além dos dois anos de prisão, têm de pagar uma multa de 110 dólares (cerca de 91 euros) por terem comunicado o sexo dos bebés aos pais e terem realizado ecografias em 2001.
Milhares de mulheres abortam fetos femininos todos os anos, o que provoca um enorme desequilíbrio de género. Há mais 32 milhões de homens do que mulheres na Índia, devido ao que o governo chama de «feticídio feminino».
O facto de as mulheres terem de pagar um dote antes de casar é um dos fatores que faz com que as famílias não queiram ter filhas. Os indianos tentam evitar assim a ruína da economia familiar na altura do casamento.²
¹ UNICEF (2006), “Situação Mundial da Infância 2007”. B&C Revisão de Textos, São Paulo. Relatório consultado a 29 de Novembro de 2009,
<http://www.unicef.pt/docs/situacao_mundial_da_infancia_2007.pdf>.
² Diário Digital (2006), “Médico condenado na Índia por divulgar sexo de bebé”, 29 de Março. Página consultada a 29 de Novembro de 2009,
<http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=10&id_news=221478>.