055 – Eis que Sou Convidada para Jantar

Andava eu a deambular pela vila, a tirar fotografias no meio das casas e das ruelas, enquanto entardecia, a ver algumas pessoas a dirigirem-se para casa… quando sou chamada da casa à esquerda, onde a criança anda a brincar na água. Oh meus amigos, já sabem que eu estou sempre pronta, eu vou logo. Deixei a bicicleta ali mesmo e fui.

Está muito escuro na cozinha, mal vejo o que estou a fotografar e esta foto ficou desfocada, é pena. Mas mantive-a, claro. Estão quatro mulheres presentes, uma delas com um bebé às costas; um rapaz dos seus 7 anos; e o homem da casa, que não me deixou fotografá-lo. Todos me receberam muito bem. Convidaram-me a sentar-me. Não falámos nada. Eu não falo chinês, eles não falam inglês. Sorrimos apenas. Mas eu não posso comer comida picante, e isso está a preocupar-me. Ainda fiz tenções de ir-me embora, agradecendo, mas eles insistiram para que eu ficasse. Percebi que há comida para todos, que a minha presença não faz diferença, e que gostariam de receber-me. Bom, liguei para a guia e pedi-lhe para ela explicar-lhes ao telefone que eu não posso comer comida picante. E enfim, também apresentar-me às pessoas, explicar-lhes de onde venho eu.

Vão usar banha de porco para fritar a carne.

Tudo tem picante e malaguetas, como se pode ver na foto. Como já tinham tudo temperado com picante, arranjaram ali um esquema de me colocarem uma tigela com água quente, onde eu molho a comida para retirar-lhe o picante, na medida do possível. A simpatia e o cuidado destas pessoas é excecional. Este jantar foi uma emoção para todos – para mim, claro, e para eles próprios. Terem assim uma convidada inesperada. Infelizmente não conseguimos conversar (se a guia fosse mais prestável eu teria tido uma conversa através do telefone – em que eles perguntavam e eu respondia – e vice-versa – tendo a guia como tradutora, ao telefone, mas ela é um pouco fechada, não me deixa à vontade para fazê-lo).
Para o jantar temos portanto: sopa de ovo e tomate; tiras de fígado fritas; ao centro está bacon (verdadeiramente delicioso) em cima de pedaços de fruta (que eu evitei por estar crua e descascada); à direita estão fatias de carne de porco assada; batatas fritas; legumes fritos e arroz. Éramos oito à mesa, contando com o bebé. Vê-se o pezinho dele à direita.

Terminado o jantar eu despeço-me desta generosa família, e sigo para o hotel, onde vou finalmente tomar um duche e descansar. Ou pensava eu. A chave do hotel? Onde está a chave do quarto?
À porta do meu quarto, no segundo andar, tiro a bolsa da cintura e esvazio-a no chão. A chave do quarto é um cartão pendurado num porta-chaves relativamente grande. Nada.
Perdi a chave do hotel.
Será que a deixei caída em casa dos meus anfitriões? Quando tirei o telemóvel para falar com a guia, quando estava sentada no sofá, se calhar caiu.
Toca a voltar para trás. Montei a bicicleta e fiz caminho para casa deles, novamente.
Encontrei-os já na rua, a uns duzentos metros de sua casa – iam passear depois do jantar, caminhar um pouco. Uma vez mais liguei para a guia e pedi para ela explicar-lhes a situação ao telefone. Uma das raparigas então voltou para trás comigo, e andámos à procura da chave. Ela vasculhou tudo – debaixo das almofadas, debaixo do sofá, nos vários sítios onde eu estive. Nada. Pelos vistos perdi a chave noutro local.
Agradeci uma vez mais e voltei para o hotel, onde a dona deste foi abrir-me a porta do quarto com um molho de cartões seus. Depois tive de deixar o meu cartão multibanco na ranhura, dentro do quarto, para ter luz. Só espero amanhã de manhã não me esquecer de tirá-lo, quando me for embora.
Entretanto lembrei-me da pequena caminhada pela montanha – quando tirei a t-shirt da bolsa da cintura e coloquei a água – se calhar foi aí que deixei cair o cartão. É a primeira vez que tal me acontece. Tantos quartos de hotel, ao longo dos anos, e foi a primeira vez que perdi a chave. Não mais voltei a vê-la.

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