050 – Chove Torrencialmente… e Eu Entro para Casa Deles
Eis que durante este meu passeio exploratório começa a chover torrencialmente. A aldeia está quase deserta, não vi ninguém na rua a não ser a senhora e a criança de há pouco. Encostei-me a uma parede e abriguei-me debaixo das telhas, com a água a cair-me à frente do nariz. Se eu chegasse a cabeça para a frente, ficaria debaixo de chuva.
E esperei.
E pensei:
Mas se eu tenho ali uma casa, uma família, porque não vou ter com eles e peço abrigo? Pareço um pinto encharcado, de capacete na cabeça, de calçõezitos e sandálias. O que estou eu a fazer aqui sozinha, na rua, a chover, no meio da China?
E corri apressadamente para a casa onde tinha visto a senhora e a criança a desaparecerem.
Fui dar a um pátio onde um homem arranjava qualquer coisa, e deparei com a senhora, que sorriu e me convidou imediatamente a sentar-me à sua porta, abrigada, num pequeno banco de madeira ali existente. Eu devolvi-lhe o sorriso e agradeci: “xie xie”; sentei-me de bom grado e tirei o capacete, bem como a mala contendo a máquina fotográfica ao ombro. Pousei-a no banco, ao meu lado.
Sim, aqui está-se melhor.
Entretanto as duas crianças que ali estão ficaram eufóricas com esta súbita e inesperada visita, pelo que se riem, vêm espreitar, e fogem para o interior da casa. Eu ri-me também, até que fui mesmo convidada a entrar.
Ofereceram-me nozes (eu comi uma – a senhora teve o nítido cuidado de não tocar no fruto com as mãos, partiu a casca e deixou-me fazer o resto, numa delicadeza extrema), deram-me chá em dois copos de papel – tinham de ser dois para não me queimar os dedos, e também me ofereceram uma garrafa de coca-cola, que eu agradeci e não aceitei.
A simplicidade e generosidade destas pessoas deixa-me sem palavras.
Esperámos um pouco, em silêncio, no meio dos risos das crianças. Atrás de mim há uma janela e eu vou observando o tempo. Não há maneira de parar de chover. Fui bebendo o chá, quente e saboroso, que me aqueceu o coração também, enquanto esta família me observava, curiosa. Eu abri a bolsa da cintura e mostrei-lhes a maçã que levo, para explicar-lhes que não tenho fome, que não preciso de comer mais nada. O lume crepita e aquece-nos a todos.
Quando finalmente a chuva abrandou, fiz-lhes sinal de que vou partir. Agradeci-lhes uma vez mais: “xie xie”, e dirigi-me para a ponte onde a bicicleta ficou parada.
Obrigada.
Obrigada uma vez mais.