040 – Os Cenários Imponentes de Yunnan

Faz um frio de rachar. O quarto do hotel está gelado e húmido. Há uma janela no corredor aberta 24h por dia, e quando me instalei no quarto, a minha janela também estava aberta, para esse corredor. Devem fazer talvez uns 15 graus à noite e de manhã. Eu não venho preparada com vestuário para isto, pelo que adotei a mesma tática dos dias anteriores: vestir três camisolas e mais o impermeável por cima. À medida em que o dia vai aquecendo, e o exercício físico se vai intensificando, vou tirando as camadas, até ficar finalmente com uma camisola de alças. E sempre calções e sandálias. Fica a nota de que mesmo assim cumpri o ritual diário de colocar o protetor solar, seguido do anti-mosquitos. Porque de manhã faz frio e nublado, mas a partir das 11 ou 12h normalmente aquece fortemente e faz sol. Cinquenta por cento dos casos de malária na China têm origem aqui em Yunnan. Não devemos brincar com o assunto. Durante a viagem não estou a tomar comprimidos contra a malária, mas irei esvaziar dois frascos de anti-mosquitos. Ponho todos os dias de manhã e à noite.

Despedi-me do grupo de turistas chineses, que pernoitou no mesmo hotel que eu – ainda estive cerca de meia hora na receção a falar com a senhora que jantou comigo na véspera, professora de inglês. Estivemos sentadas, à espera dos respetivos motoristas, sempre a falar e a tirar dúvidas. Ela sobre mim e o modo de vida ocidental em geral (o meu cabelo encaracolado veio à baila, pois claro), eu sobre eles e o seu modo de vida (e o seu cabelo também!). Depois despedi-me novamente do meu anterior motorista, o Jai Song; e parti de bicicleta, num cenário espantoso. O Nong Bu e a guia ficaram para trás, dando-me algum avanço.

Deixo aqui um comentário sobre a forma dos chineses se cumprimentarem. Foi algo que me esqueci de perguntar às pessoas com quem fui conversando entretanto. Não me ocorreu. No final das nossas conversas despedi-me com um adeus e um sorriso, e pronto. Quando finalmente quis despedir-me do Jai Song – uma despedida mais séria e de agradecimento por toda a ajuda que me tinha dado até então, nomeadamente a carregar bagagens e bicicletas, perguntei à guia se habitualmente as pessoas se despediam com um beijinho, dois, ou mais beijinhos. A guia, sempre pouco conversadora, riu-se e disse que eu podia dar-lhe quantos beijinhos quisesse. Ela não percebeu que eu fazia uma pergunta séria, e que precisava mesmo de ter essa informação. Bom, chamei o Jai Song e dei-lhe dois beijinhos de despedida, à boa maneira portuguesa.
Mas não.
Os chineses não se despedem assim.
À pala da pouca informação da senhora dona guia, devo ter embaraçado o rapaz, que teve de ouvir assobios e piropos de todos os seus colegas motoristas, que ali estavam à espera de arrancar com os respetivos grupos. Vim a saber mais tarde, já a conversar com umas raparigas chinesas que conheci posteriormente, que na China não há beijinhos. Não é usado. De facto quase que tive de puxar pelo colarinho do Jai Song para finalmente conseguir espetar-lhe com os dois beijinhos. Bom, pelo menos fiquei de consciência tranquila. Agradeci-lhe como deve ser. Isto de acenar com a mão e virar as costas, não é coisa de portugueses.

O meu frugal pequeno-almoço, constituído por um ovo cozido, o pão tradicional chinês (parece uma panqueca e é bastante saboroso) e a bebida que nem percebi bem o que era, talvez chá com leite. Eu trouxe comigo, de Portugal, umas bolachas, para ajudar… A meio da manhã trinco umas bolachas. O carro de apoio também tem comida disponível: barras de cereais, fruta, comprimidos energéticos para dissolver na água, e a meu pedido, pacotes de leite, dos pequeninos. Eu pedi com chocolate, mas curiosamente na China não há pacotes de leite com chocolate. Ao longo dos 25 dias fui espreitando os supermercados e mercearias, e quase todos vendem pacotinhos de leite, mas com outros sabores, nomeadamente morango – com pedaços de morango – que eu gostei bastante. Nunca passei fome nesta viagem, felizmente, mesmo com as constantes malaguetas pelo meio.

Um moledro, ou seja, um monte de pedras empilhadas. Conforme explicado na crónica 11, o moledro chama-se “Ovoo” e é usado como altar e santuário. Presta homenagem ao espíritos do céu e das montanhas, além de garantir uma viagem segura.
Pelo menos eu não tenho razão de queixa: estes Ovoos proporcionaram-me sempre uma viagem magnífica na bicicleta.

Um glaciar.

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