028 – Um Encantador Passeio de Cavalo pelas Montanhas

À última da hora decidi que quero fazer o passeio de cavalo. Após a caminhada apercebi-me que poderá ser bastante interessante. Está a entardecer, há menos gente, e já está mais fresco. A guia telefonou então para o vizinho da nossa Casa de Hóspedes, o qual tem cavalos, e verificou que está disponível. Ele veio buscar-me ao local onde estamos, depois do pequeno trekking, e levou-me. O Jai Song e a guia foram-se embora, regressaram à Casa de Hóspedes. Eu fiquei com instruções de dizer “acabar” (em chinês) quando quisesse acabar o passeio. Tenho de dizer “Rua Xu” para o dono dos cavalos me perceber.
E aí vamos nós, cada qual no seu cavalo, sem horários definidos.

Foi um passeio encantador. Qual Rua Xu. Nem me atrevi a dizer nada, não fosse ele pensar que eu queria ir-me embora. Começámos logo pelo caminho que eu tinha acabado de conhecer, na minha exploração pelo mato. Ele com certeza pensa que está a dar-me a conhecer algo novo, quando eu ainda há pouco andei aqui a tirar fotos. Reparei porém que o montículo de pedras que deixei, para identificar o caminho, já lá não está. Alguém deitou as pedras ao chão.
Depois enveredámos pela montanha, nos estreitos caminhos de terra.
E o céu começou a ficar negro. Anoitece a toda a velocidade, mais pela negritude da tempestade que se avizinha, do que propriamente pela hora tardia. As trovoadas ouvem-se ao longe.

O dono dos cavalos começou entretanto a cantar música chinesa tradicional. A música – lindíssima – e os pássaros a cantar, e a trovoada. O cheiro húmido da floresta. E mais trovoadas ao longe, a aproximarem-se cada vez mais. Começaram a cair uns pingos de chuva. Mas eu não quero ir-me embora. Estou a sentir-me tão bem, neste passeio de cavalo simulando a Rota do Chá e dos Cavalos. Tive um vislumbre do que seria fazer estes longos percursos pelas montanhas de Yunnan. Tanta gente que terá passado aqui, tantos cavalos, tanta história, tantas vidas e também sofrimento.
Não vou dizer Rua Xu.
Não quero que este passeio termine.

Mas quando começou a chover a sério… eu disse baixinho: “Rua Xu”.
Foram as minhas únicas palavras durante uma hora e pouco. E foram ditas com contrariedade. Calculo que o dono dos cavalos me tenha ouvido, mas nem disse nada e continuámos a andar. Acho até que se riu, e eu ri-me também. Certamente ele já iria direito a casa, já chovia a sério por esta altura. Eu entretanto escondi a câmera dentro da bolsa da cintura, nem sequer trouxe a sua mala, nunca imaginei que viesse uma trovoada deste calibre. Começa entretanto a chover copiosamente. Torrencialmente. Está tudo alagado. O dono dos cavalos vem socorrer-me: tirou uma capa de plástico de um alforge do meu cavalo, uma capa azul escura, e atirou-a por cima da minha cabeça, vestindo-ma. Eu quieta, em cima do cavalo, mais preocupada com a câmera e com o relógio, do que propriamente comigo. De seguida ele tirou uma capa para si próprio, uma lilás com bolinhas brancas. Mas apercebeu-se que não queria essa capa e vá de trocá-la comigo. Tirou-me a minha capa azul escura e vestiu-me a lilás. Ele ficou com a azul. Eu quieta e calada em cima do cavalo, no meio desta operação, sempre a chover torrencialmente. E continuámos o nosso passeio, agora os dois protegidos com um impermeável, o qual eu estendia também pelo meu cavalo, protegendo-o até à cabeça. As minhas sandálias ficaram encharcadas, mas essas rapidamente secam.

Foram relâmpagos e trovoadas, e tanta chuva. Uma chuvada torrencial que vai durar toda a noite. A chuva mete-se pelo meu capuz, os cabelos que não aturam quietos dentro do capuz acabam por sair e ficaram molhados, claro, e ainda me escorria água para dentro da camisola. E os cavalos sempre a andar.
E eu sem querer terminar o passeio.

Quando finalmente chegámos a sua casa (que fica ao lado da Casa de Hóspedes onde eu estou), ele foi guardar os cavalos no estábulo e ligou ao Jai Song e à guia, para virem buscar-me. A sua mulher riu-se com a minha inesperada visita e com o facto de eu andar a fotografar tudo. Convidou-me a sentar. Claro que me sentei e esperei, tranquilamente. Depois de um passeio destes, tão extraordinário, não tenho qualquer pressa. Que pena ter começado a chover tanto, o passeio devia ter durado duas ou três horas, em vez de uma hora e pouco.

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