006 – Almoço e Continuação do Passeio por Shuhe

Não há inglês. Esqueçam o inglês. Ninguém fala inglês. Este menu tem imagens, já não é mau de todo. Há os que não têm. O serviços da guia aqui são essenciais. Deixei quase sempre ao seu critério a escolha do menu. O mais que podia dizer era se me apetecia carne, peixe, vegetais, arroz ou noodles (esparguete). O resto escolhia ela. No aeroporto de Pequim comi os meus primeiros noodles e já foi um sarilho explicar à rapariga que não os queria picantes. “Not spicy”. Ela colocou o seu smartphone à frente da minha cara para eu dizer “not spicy” ao telemóvel e ele traduzir. Fizeram-me isso várias vezes ao longo da viagem. Depois o telemóvel (ou a app) nunca percebe à primeira. Então eu repito. “Not spicy”. Aquilo lá traduziu e ela apontou-me para uma imagem no menu. Está bem, venham esses noodles. Deixa lá ver se o telemóvel traduziu bem. Os noodles são uma tigela com caldo e esparguete, ou com porco ou com vegetais. É raro haver de vaca, só encontrei uma vez, em Pequim, e nem tenho a certeza se o que comi era vaca. A alimentação na China, sem falar inglês, é uma autêntica aventura. Estes noodles no aeroporto eram de porco, com entrecosto, uma delícia. Nem uma gotinha ficou na tigela. Ainda hoje sonho com os noodles do aeroporto de Pequim, na verdade. Sempre com pauzinhos, claro. Esqueçam o garfo e a faca, isso também deixou de existir. Imaginem comer esparguete em caldo com pauzinhos. O que é certo é que habitualmente eu não deixava nada nas tigelas. Bebia sofregamente pela própria tigela, com muito barulho, como eles próprios fazem. Oh meus amigos, a gente não se atrapalha.

Este primeiro almoço foi delicioso também. Aliás, toda a comida na China é deliciosa. Regalei-me. Tinham-me avisado que a comida era muito diferente da dos restaurantes chineses em Portugal. Não é assim tão diferente. É sim mais completa, com muito mais variedade.

Agora temos cogumelos recheados com carne picada de porco (magníficos); omelete de cebolinho; o legume cozido ao centro não sei o que é, só fiquei a saber o nome em chinês: You Mai Cai. Era bom, é o que interessa. Estava tudo muitíssimo bem temperado. E pepino cru à esquerda – que não comi – nós, turistas ocidentais, não podemos comer comida crua na Ásia, sob pena de ficarmos com uma gastroenterite ou diarreia. Tem de ser tudo cozinhado para matar a bicharada. Basta cortarem os legumes com uma faca molhada com água da torneira e adeus. Só podemos beber água engarrafada, inclusive para lavar os dentes. Não que seja de má qualidade – não é isso – a questão é que não estamos habituados àqueles micro-organismos. Na consulta do viajante que tive em Lisboa, antes da viagem, trataram de esclarecer-me sobre tudo isto. Eu já sabia de viagens anteriores, mas calei-me e ouvi. E levei sete maravilhosas injeções que até andei de lado. Vacinas como a da febre tifoide, a febre da carraça, e até uma vacina contra a raiva (tomada em 3 doses…). Fora as que já tinha e que não foi necessário tomar agora. Sim, porque quando o médico soube que eu ia andar de bicicleta no campo, fez-me levar as doses todas.

Aqui estou eu com umas valentes olheiras, depois da viagem, com horários e sonos trocados, a almoçar às seis da manhã (em Yunnan são 7h a mais, são portanto 13h, contudo o meu organismo ainda não sabe isso…) mas ao menos estou feliz!

A máscara na cara é muito comum, já a tínhamos visto no Vietname (para quem acompanhou as crónicas do Vietname) e tem dois objetivos: evitar a poluição – que não é o caso aqui – e evitar o sol. O principal objetivo aqui em Yunnan é evitar o bronzeado. Os chineses não gostam de se bronzear e de ficar morenos. Como uma cultura pode ser tão diferente, não é verdade? Nós, portugueses, em grande lufa lufa a caminho da praia para nos bronzearmos… eu, lula branca, como fui chamada uma vez por uma prima minha (efetivamente ela chamou-me apenas “lula”, mas eu não percebi. Uma lula? Porque sou uma lula? Porque as lulas são brancas, daaahh…), portanto, eu  – lula branca – sempre em grande esforço para conseguir ao menos ficar com uma corzita creme claro. E esta malta chinesa a esconder-se do sol, sempre de calças ou collants opacos e mangas compridas.

Loja de carne de iaque. Vou comer algumas vezes iaque, e irei ver iaques mais à frente. A carne é parecida com a de vaca, mas um pouco mais tenra.

Com grande alarido de música estridente vem esta carrinha. Que é isto, no meio das casas, das lojas e das pessoas? Com música verdadeiramente roufenha, a andar tão devagar? Pois é a recolha do lixo. As pessoas que ali trabalham ouvem a música logo à distância (pudera),  preparam os sacos do lixo e vêm a correr para deitá-los fora. Comecei a ver as pessoas a sairem de várias lojas, todas com os sacos do lixo na mão – e  a carrinha não pára, vai sempre em andamento – todos em passo apressado atrás da carrinha para deitarem os sacos de lixo fora… esta é boa.

Bolo quente. Apeteceu-me tanto provar aquele bolo quente. Deitava fumo e cheirava às papas do bebés. Mas é arriscado, não posso arriscar: não sei como foi cozinhado, tenho receio de apanhar uma gastroenterite. Em todas as viagens que faço para estes destinos exóticos, apanho sempre uma gastroenterite e sofro tanto. Não posso.

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