34 – Regresso a Portugal

Mais banitsas, desta vez dentro do metro de Serdika. Mas não comi nenhuma.

Estação de metro de Serdika. Aqui também vi uma coisa que ainda não tinha visto: o metro tem grades. Só depois do metro estar parado, é que as grades levantam. Acabaram-se as quedas e os suicídios, portanto.

O metro em Sófia tem uma forma de funcionamento um pouco confusa, porque não indica o nome da última estação. Ou seja, aqui a última estação é “Aeroporto”. No entanto o metro não indica isso. Éramos vários turistas na estação de Serdika, todos com bagagens, e todos a perguntarem uns aos outros se “este metro” vai para o aeroporto. Sendo que naquela estação de Serdika passam dois. Primeiro passou um, com outro destino – e aqui já tinha escrito o nome da última estação. Nenhum de nós entrou. Depois veio outro metro, e todos esperávamos que dissesse “aeroporto”, em búlgaro – como estávamos a ver nas placas. Tal como vimos o nome do outro metro (em búlgaro também), seria agora fácil, igualmente, identificar a palavra. Mas não, o metro veio com outra terra qualquer, indicada na frente. Pior: perguntei a uma das passageiras búlgaras, uma rapariga que falou comigo em inglês, e ela também não sabia e disse que só iríamos saber quando chegássemos a uma bifurcação indicada no mapa, dentro do metro. E assim foi: quando chegámos à bifurcação, finalmente os altifalantes começaram a anunciar que o metro ia para o aeroporto. Ora isto devia ser indicado logo desde o início, não a meio da viagem. Estivemos, até essa altura, todos na expetativa se era este o metro ou não, se teríamos que mudar ou não.
Nunca tinha visto um funcionamento assim, em tantos metros que já andei pelo mundo. E o mesmo aconteceu na estação de Lavov most, na crónica 28. Antes de picar o bilhete, olhei para as estações indicadas na placa junto ao teto. A última estação – Vitosha – é omissa. Simplesmente não consta. Temos que adivinhar que o metro vai para Vitosha, apesar de não dizer nada ali. Foi o polícia que lá estava que me ajudou. Eu nem lhe perguntei nada, eu estava a ver os nomes das estações na internet, e a compará-los com a placa no teto (tudo em alfabeto cirílico) e estava a verificar que as letras eram iguais. Falta a última estação, mas hei de lá chegar. O polícia nem me deu tempo de nada, abordou-me e mandou-me entrar para aquela linha, depois de eu lhe dizer que ia para Vitosha. Foi simpático.
Os búlgaros terão com certeza um motivo para agir assim – esconderem o nome da última estação de metro. Eles lá saberão.

São agora 16h09. O meu voo é às 19h30. Na vinda para cá foi uma azáfama no aeroporto de Lisboa, às 11 da noite. Uma multidão. Cheguei duas horas antes, como é suposto, e já fiquei no fim da fila. O voo esgotou. O aeroporto empanturrado. Estive duas horas em filas constantes, a passar nos controlos todos, até finalmente entrar no avião. Nem consegui ir à casa de banho. Que loucura, no aeroporto de Lisboa. Desta vez, aqui em Sófia, achei melhor vir mais cedo.

Estou muito contente, mas estou no terminal errado. O meu bilhete diz “terminal 2“. Este é o terminal 2, e nunca mais anunciam o check-in. A certa altura levantei-me e fui às informações perguntar. Afinal o meu voo é no terminal 1, e é preciso ir de autocarro até lá. O meu bilhete não diz nada. Só diz “terminal 2” – e afinal esse é o da chegada, em Lisboa. Bom, calharia bem a Wizzair escrever no bilhete também o terminal da partida, e não só o da chegada.
A senhora do balcão das informações diz-me que acabou de partir um autocarro, e que tenho outro dentro de trinta minutos, às 18h15. É tarde demais para a confusão que é este voo. Abordei um taxista: quero ir para o terminal 1, mas só tenho euros.
Eu já tinha cambiado os leva por euros, na agência de câmbios do aeroporto. Por sorte calhou-me um rapaz simpático, e que sabia falar inglês (o taxista da minha chegada à Bulgária não sabia, por exemplo), e disse para eu entrar. Quanto é?, perguntei-lhe. Ele fez um sinal que não seria nada significativo. E fomos atrás do autocarro que passou trinta minutos antes. No final ele disse-me para pagar o que eu quisesse. Dei-lhe uma nota de 5€. Dez leva. Ele ficou contente, a viagem não vale nem dois leva. Mas foi tão prestável, tão rápido e atencioso, não me colocou problemas nenhuns com os euros (agora ele tem que ir cambiar a nota), e safou-me tão prontamente, que foi com gosto que lhe dei os 5€.

Que cemitério será este? É enorme. Mas não me parece ser o cemitério central de Sófia, que tem mais árvores, e casas à volta, conforme mostrei na foto aérea da crónica 26. Este é outro, e é enorme também.

Isto ainda é na Bulgária, tirei esta foto logo a seguir à partida, ainda não tivemos tempo de chegar a outro país.

Agora sim, Lisboa. São 22h30, na hora local. Chegou meia hora atrasado. O voo dura 4h30, mais 40 minutos do que na ida para a Bulgária. Quarenta minutos de diferença é imenso. Ou seja, para a Bulgária, o voo dura 3h50. No regresso a Portugal dura 4h30. Terá que ser uma rota totalmente diferente.

E assim cheguei, de outra magnífica viagem, desta vez com pinturas minhas. Foi uma experiência espantosa, participar na “Water Tower Art Residency”, na pequena cidade de Lom.

Que continue por muitos mais anos – a residência; a atividade incansável da diretora, a artista búlgara Nia Pushkarova, bem como de toda a sua equipa; e ainda o patrocínio do Ministério da Cultura, ou outras entidades, nestes eventos tão simples, e no entanto tão importantes no desenvolvimento das artes, das terras e das gentes. Que Lom prospere!

Quanto a mim, realizei a mediação pictórica da viagem, pela primeira vez – no momento. E cito as minhas próprias palavras, escritas na minha recente dissertação de mestrado em Pintura¹: não se tratou de ver imagens na internet, ou de ler livros: foram vivências, cheiros, trilhos verdes percorridos. Experiências autênticas. De facto, ver – ver apenas – não envolve profundamente as emoções, e torna-se, como tal, algo distante. Podemos ver na televisão a Amazónia, mas só “o gosto do limão, a textura de uma pele quente, e o som do farfalhar das folhas, nos atingem como sensações”, como afirmou o geógrafo Yi-Fu-Tuan.² Ao fazer a mediação, materializei estas sensações, tornei-as reais. Existiu uma história que não pode ser apagada e que foi incorporada num objeto: a pintura, materializando desta forma o volátil, o passageiro e o passado. Sim, a experiência não pode ser recuperada; passou a fazer parte da memória. Mas o objeto – a dimensão material da obra – como pequena e simbólica parte do que vivenciei, assumiu o poder de despertar memórias e de transportar para um passado.

*

Quem não vive no passado, porém, e está vivo neste momento, é o gato Simba. Ainda se lembram do gato Simba, resgatado na crónica 14? Aí vai uma foto dele atualizada, agora de setembro, que a Maya teve a gentileza de enviar-me. Está bonito, o rapaz:


¹ Norte, R. (2022). “A experiência do lugar: a sua influência na produção pictórica do artista-viajante, no século XXI”, p. 102. (Dissertação de mestrado em Pintura, Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, Portugal). Disponível em:
https://repositorio.ul.pt/handle/10451/55792
Versão em inglês: “The experience of place: its influence on the pictorial production of the artist-traveller, in the 21st century”. Disponível em:
https://rutenorte.com/media/

² Tuan, Y. (1980). “Topofilia: um estudo da perceção, atitudes e valores do meio ambiente”, p. 12. São Paulo, Brasil: Difel.

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