18 – Passeio de BTT

Foi o Boyan quem me ensinou este caminho. Ou melhor, o Boyan ensinou-me o destino, mostrou-mo no mapa. Depois eu optei por seguir por caminhos para bicicleta. Este é um print-screen do meu telemóvel, uma cópia da maravilhosa aplicação “Maps.me”, gratuita, que me tem acompanhado nos últimos anos. Esta app tem várias opções: é possível escolher um percurso para peões, para bicicletas, para carros, ou então de comboio e metro, no caso de existir.
O Boyan explicou-me que já não vai a esta zona há mais de um ano, e que são locais da sua infância. O Boyan (que é músico, recordo) nasceu e vive aqui em Lom.
A app diz-me que são 7 km para lá, e que chegarei em 34 minutos, às 10h04.

Agora é que a festa vai começar!

O rio Danúbio está atrás destas árvores, diz-me o Maps.me.

Há uma realidade oculta nesta foto – que vocês não vêem – mas eu senti-a e ouvi-a. Há milhares e milhares de melgas. Parar dez segundos para tirar esta foto foi uma aventura de zumbidos e picadas. Nem é aconselhável andar com os olhos muito abertos, calha bem usar óculos, pois são tantas que se corre o risco de se meterem na vista. Mas eu queria chegar ao rio Danúbio, e ver os caminhos rente ao Danúbio, para prosseguir de bicicleta por aí.
Nem consegui pedalar. Houve cheias recentemente, talvez há um mês, e andou tudo alagado por esta zona, contaram-me. Agora a lama está dura, mas é muito difícil pedalar aqui, ainda por cima um pouco descontrolada com as melgas a picarem-me a zumbirem-me loucamente aos ouvidos. Corri com a bicicleta pela mão.

Cheguei ao rio Danúbio, mas não tem saída. E as melgas aqui ainda são piores do que no meio das árvores. Tirar esta foto, só como como recordação (estive aqui!) implicou mais trinta picadelas pelo corpo todo, a juntar às vinte que eu ganhei ao passar na floresta. Curiosamente estava um carro vermelho parado junto ao rio. Um carro novo, bonito. Mas não vi ninguém. É possível alguém estar aqui? Será que estava alguém a dormir dentro do carro, e eu a correr, nem vi? Nem quis saber, não é boa onda aproximar-me de carros estranhos em locais desertos, até me afastei.
Eu não pus spray repelente de insetos, esta manhã, antes de vir para aqui, porque não estava à espera disto. O Boyan esqueceu-se de contar-me este detalhe: o passeio é muito bonito, mas há melgas. E vocês podem dizer: então mas tu não calculaste isso, Rute? Não calculei, não. Eu estou a nadar todos os dias no Danúbio, e não há melgas. Ou existem apenas algumas já com o sol a ir-se. Porque é que há aqui? As melgas têm localizações prediletas, nas margens do rio Danúbio? Pelos vistos sim, mas como é que eu ia pensar como uma melga? Se eu fosse melga, eu saberia quais os meus locais prediletos, mas eu não sou melga. Ou pelo menos esforço-me por não ser.
Bom, e agora não tenho saída, e agora tenho que atravessar tudo novamente, para trás. Toca de correr novamente pelo meio da floresta. Mais vinte picadelas. Já vão em setenta, isto está bonito.

Aqui já estou noutro caminho, mais alto, mais longe do Danúbio. Há uma quantidade normal de melgas, que a esta hora até são poucas, pois faz muito calor. São 11h21. Deixei um litro de sangue neste passeio, portanto. Se a minha função na natureza não foi mais nenhuma, pelo menos alimentei 347 melgas. Vejo na internet – no website da Câmara Municipal de Lom – a seguinte notícia:

“De 31 de julho a 4 de agosto de 2023, em condições climáticas adequadas – sem chuva e velocidade do vento de até 5 m/s, das 20h30 até à conclusão, mas não depois das 06h00, será realizado um tratamento de solo contra mosquitos no território da cidade de Lom e aldeias do município. O tratamento será realizado com um método combinado usando um aerossol quente e frio. Serão utilizadas as seguintes preparações:

– Aerossol frio – “Efcimetrina” na concentração de 200 ml por 10 litros de água. Concentração da solução de trabalho por substância ativa: 0,2%.

– Aerossol quente – “Microsin”, taxa de consumo 1:250 com nafta ou óleo com um consumo de 0,5 l p-r/hectare ou 0,500 l por decre.

Em caso de condições climatéricas adversas, os tratamentos serão adiados até à estabilização do tempo.”¹

E mostram esta foto:

Por isso é que as melgas estão aqui nas zonas desertas do Danúbio! Afinal não é uma escolha das melgas. Se forem para as zonas habitadas, morrem. Isto de viver ao lado de um rio muito lindo, tem os seus contras.

Deixo a nota de que neste site, da Câmara Municipal de Lom, também encontro o anúncio da nossa exposição, da Water Tower Art Residency. Publicaram uma notícia a 19 de julho, a anunciar a inauguração no dia seguinte. Dizem: “O projeto é concretizado com o apoio do Ministério da Cultura e da Câmara Municipal de Lom.” E está lá o meu nome! Yeeaaah!

Ainda fiz uns minutos por aquele caminho, da foto anterior, muito abandonado; eu queria chegar ao destino seguinte, definido por mim própria, mas a aplicação Maps.me dizia-me que seria meia hora para lá, e outra meia hora para cá. Fora o resto do caminho até chegar ao hotel. E a hora de almoço aproxima-se. Preciso de água e de comida. Voltei para trás, não prossegui.
Nesta imagem são 11h28 e eu encontro-me onde está a seta azul. O meu hotel está depois do Dunavski park.

Voltei para trás e regressei ao hotel, desta vez por caminhos para peões:

A aplicação Maps.me diz-me que são 6,3 km e dá-me o tempo de viagem a pé, 1h19’. Sendo de bicicleta, supostamente será mais rápido. É sempre uma incógnita escolher caminhos de peões, e depois fazê-los de bicicleta. Pode haver alguma surpresa (como já houve em viagens anteriores). O risco é meu, mas eu decidi corrê-lo, não quero voltar pela estrada.

São agora 11h49 e finalmente vejo gente. Parei e desmontei.

Parece-me que o Kiril é o dono desta quinta. Não sei se o seu nome se escreve assim. O Kiril quis que eu lhe enviasse as fotos, e tivemos ainda alguns minutos a tentar descobrir o seu nº de telemóvel, com o indicativo da Bulgária. Deu-me dois números que não funcionaram. Eu ligava, mas ele não recebia chamada nenhuma. Até que lhe dei eu o meu próprio número, com o indicativo de Portugal, e ele fez um toque, e finalmente fiquei com o seu Whatsapp para lhe enviar as fotos. E sim, enviei-lhas mais tarde, quando as descarreguei da máquina fotográfica.
O Kiril falou comigo em alemão, italiano e inglês. Umas palavras aqui e ali, e a gente foi-se entendendo. Desta vez eu não quis usar o Google Translator, no meu telemóvel, porque estou a ficar sem bateria. Tenho de comprar uma bateria nova, esta já deu o que tinha a dar, nem devia ter vindo para a Bulgária com ela.
Então o Kiril explicou-me que exportou duzentos cavalos para a Alemanha, e assim viajou para lá. Também viveu em Itália, e depois disse que também tinha exportado cavalos para Portugal. Eu já sei dizer “Portugal” em búlgaro (que não é muito diferente, é algo como “Portucalo”), mas para o caso de não perceberem, eu tratava de dizer o nome do Cristiano Ronaldo, e percebiam logo todos. Portucalo! Ronaldo!
Aah! Portucalo!
Certo.
O Kiril e a senhora que está com ele, ambos fizeram questão de dizer-me que não é a sua mulher. O Kiril mostra-me que não tem aliança, pergunta-me pela minha, e de seguida pergunta-me se eu quero constituir família com ele. Rimo-nos as três – eu, a senhora e até a menina riu.

O Kiril regressou ao trabalho e a menina foi mostrar-me as instalações e os animais.

Um quarto de hora depois eu despeço-me e prossigo caminho. Este homem da carroça ainda me ajudou, uns metros à frente, porque haviam cães à solta, grandes, a ladrarem e a perseguirem-me na bicicleta. Foi aborrecido. Eu mantive-me ao lado da carroça e ainda vi a coisa mal parada. Os cães aproximaram-se perigosamente das minhas pernas, muito agressivos. A mania que as pessoas têm de deixarem cães à solta, que atacam quem passa. Sempre que dou estes passeios de bicicleta, temo estas situações. Podem trazer complicações sérias, no caso dos cães morderem. E não é assim tão raro enervarem-se e morderem. São bichos irracionais, é preciso ter atenção. Se já um humano se enerva e perde o controlo, imaginem um cão.

A ponte sobre o rio Lom.

São 12h51. Vou almoçar. A bicicleta fica guardada no meu quarto, como é hábito. Tenho muitas fotos destas, com uma bicicletazinha, mais preciosa do que ouro, a dormir comigo no meu quarto, em todos os continentes do mundo. Ainda por cima esta não é minha, tenho que ter particular cuidado.


¹ ОБЩИНА ЛОМ, Официален интернет сайт (28.07.2023) “НАЗЕМНО ТРЕТИРАНЕ СРЕЩУ КОМАРИ ЩЕ СЕ ПРОВЕДЕ ОТ 31 ЮЛИ ДО 4 АВГУСТ 2023 Г. В ГРАДА И СЕЛАТА”. Página consultada a 4 de agosto de 2023:
https://www.lom.bg/currentNews-3940-newitem.html

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