Dia 26 – No sul da Arménia – Devil’s Bridge & Goris
Hoje é 6ª feira, 26 de julho de 2024. É o dia do meu regresso a Mush 2. Mas ainda tenho metade do dia livre, a minha marshrutka para Yerevan só parte às 16h de Goris.
Tive um sono leve, agitado, estas viagens causam stress. Acordei às 5h30, e levantei-me às 6h30. Dormi umas 5h30. Tive grande troca de mensagens à noite, já tarde, com a Milena e o Artur por causa da minha viagem hoje. Foi outra dor de cabeça marcar a viagem de regresso. Desta vez o Jivan – o dono do hotel – ajudou-me também, além da Milena e do Artur. A marshrutka é às 15h, tal como diz na internet, mas agora tem saído às 16 horas, e foi o Jivan que telefonou para lá, a marcar.
E agora não há táxis partilhados entre as 16 e as 21h, entre Yerevan e Gyumri, aparentemente estão esgotados, nem aparece a opção de selecioná-los. Estes táxis são de hora a hora.
Nesta imagem vê-se a reserva na aplicação da Yev-Yev. Existe um táxi partilhado às 15h, e depois só existe às 22h. Parecem não estar a conseguir dar conta do serviço, com tantos horários esgotados.
São 6h59 e este é o primeiro pequeno-almoço no quarto: leite, iogurte arménio e fruta. O pequeno-almoço no hotel é servido apenas às 8h30 / 9h.
Após o pequeno-almoço, irei direta a Devils Bridge.
Às 6 horas a vaca mugiu aqui ao lado, e já estavam duas mulheres sentadas na rua, a conversar. Tentei tirar uma foto, mas o nevoeiro e a rede de mosquitos não permitiram, a máquina não conseguiu focar.
Às 7h30 saí para dar uma volta pela aldeia.
Ali sou mesmo eu, a desaparecer nas brumas.
São 8h22.
À esquerda do doce de damasco tenho um novo queijo, o Jivan e a Alvart disseram-me o nome: kathnashvor. É requeijão de vaca. É bom, comi-o com pão e doce.
Hoje comi dentro desta divisão, ao lado da cozinha, porque está frio e molhado lá fora.
Entretanto ajustei o meu programa de hoje com o Jivan: este leva-me agora a Devils Bridge por 4.000 drams. Depois vai-me buscar quando eu lhe telefonar (eu não faço ideia a que horas regresso). E depois às 14h leva-me a Goris por outros 4.000 drams. Às 16h tenho a marshrutka em Goris, para Yerevan. Serão 4 horas de viagem.
São 10h13 e o Jivan deixou-me em Devils Bridge. Deixo uma imagem aérea, que retirei da internet, para se ter a noção de como é:
Nesta imagem vê-se o desfiladeiro do rio Vorotan.
A “ponte” em si é na verdade uma formação natural de rocha calcária sobre o rio, e por baixo dela existem grutas com formações calcárias também. Os carros passam por cima desta ponte natural (na imagem anterior, estamos em cima dela). O nome “Devil’s Bridge” é utilizado para designar várias pontes em todo o mundo, que frequentemente estão associadas a lendas ou mitos sobre como o diabo (ou “devil” em inglês) esteve envolvido na sua construção. O nome geralmente implica que a construção da ponte foi tão difícil ou surpreendente que só poderia ter sido realizada com a ajuda sobrenatural.
Existem quatro guias aqui, e neste momento é o Vachik que está de serviço, explicou-me este. Ele mostra-me – a mim e a um casal de turistas, dos seus 28/30 anos – que é preciso descer isto. Esse casal desistiu e foi-se logo embora. E eu assustei-me, mas não disse logo que não. Mau, o meu passeio a Devils Brigde não pode acabar já aqui. Se eu não descer isto, acabou-se o passeio, posso telefonar já ao Jivan para vir buscar-me – este ainda nem teve tempo de chegar a casa, aliás.
Então sentei-me aqui mesmo, a olhar, e à espera que chegassem outras pessoas, para eu ver como é. Gostaria de ver alguém a descer primeiro, e depois logo se vê.
Mas esperei algum tempo e não apareceu ninguém. Eu sozinha, aqui sentada, e o guia Vachik a dizer-me que não há dificuldade nenhuma, e que posso descer. Ele não fala inglês, simplesmente me diz por gestos.
Claro que eu tenho de ir.
E agora dou conta que existem piscinas de água mineral natural, conhecidas por serem quentes e ricas em minerais. A minha investigação na internet não chegou aqui, fui apanhada de surpresa. Só depois vim a descobrir: “Os visitantes podem explorar as formações rochosas, mergulhar nas águas termais e apreciar as impressionantes vistas do desfiladeiro de Vorotan. Para os mais aventureiros, é possível descer para explorar as cavernas e grutas escondidas debaixo da “ponte”.
Eu quero explorar as cavernas e grutas!! E não trouxe o biquíni!
Não há ninguém aqui, sou a única pessoa. Tenho várias hipóteses:
1ª: não vou (mas eu quero ir – esta hipótese fica já excluída);
2ª: vou vestida e fico com a roupa molhada colada ao corpo, e o mais certo é adoecer com uma constipação;
3ª: vou de cuecas e soutien, mas o soutien vai levar muito tempo a secar, e não tenho outro soutien aqui no sul. Só vou chegar à meia-noite ao estúdio, em Mush;
4ª: vou só de cuecas;
5ª: vou completamente nua.
Optei por um meio termo: vou de cuecas. Eu não podia ir-me embora daqui sem experimentar estas águas relativamente mornas, ricas em minerais, e tinha que explorar as grutas. Está mais frio lá fora, do que aqui dentro. A água está morna.
Sinto-me uma autêntica mulher das cavernas, de tanga. Eu gostaria de dizer-vos que aquilo é o meu biquíni – e se eu dissesse, vocês acreditariam, porque o meu biquíni efetivamente é igual. Mas não, são mesmo as minhas cuecas. E apesar de ter a mão no peito, a tapá-lo, mesmo assim ainda se vê uma parte, e achei melhor pôr ali um tigrezinho.
É púdico da minha parte, eu sei. Afinal de contas todos estamos habituados a ver atrizes famosas nuas, ou com o peito à mostra, mas pronto.
Aqui fica uma foto que retirei da internet, com a gruta e as formações calcárias, e sem a mulher das cavernas.
Chegou a hora de regressar. O guia Vachik espera por mim.
Eu com os calções molhados por causa das cuecas molhadas. Vão secar num instante, felizmente. Posso dizer-vos que valeu a pena, ainda bem que decidi fazer isto. Vir de tão longe, de Portugal, chegar aqui, numa viagem tão difícil que precisei de outras pessoas a marcarem-ma, e ir-me embora sem ver as grutas e as piscinas… era mau, não era?
São agora 11h33. Estive ainda bastante tempo aqui parada, a observar e a fotografar as pessoas. Finalmente começaram a chegar turistas. Ainda bem que eu vim cedo, tive as grutas só para mim, agora isso seria impossível.
Pude constatar que apenas os homens e as crianças tomam banho e vão até às grutas. As mulheres desciam isto, e não prosseguiam, voltavam para cima. Porque prosseguir implica despirem-se. Esta rapariga só foi até lá abaixo, e voltou logo.
Esta senhora sim, prosseguiu. Ela tirou a roupa lá em baixo e prosseguiu com esta túnica verde a cobrir-lhe o corpo. Valente, heim.
São agora 12h24. Passei mais de duas horas em Devils Bridge, foi bom. As minhas cuecas e os calções entretanto já secaram – é uma coisa espantosa, no meio desta humidade e frio. Ali em baixo o ambiente é morno.
E esta família deu-me boleia de volta a Halidzor. O Jivan vinha buscar-me, mas a Nadya abordou-me e cumprimentou-me, disse-me que me viu a caminhar na aldeia de Halidzor, hoje de manhã, e perguntou-me se eu podia enviar-lhe as fotos que tirei da sua família, a descerem a rocha. Eu nem dei conta que era a sua família (a foto do seu marido e da sua filha estão acima – e eu tirei mais, a outras pessoas, mas apaguei-as porque já eram muitas e repetidas), e claro que acedi, trocámos de WhatsApps e enviei-lhas no dia seguinte. A Nadya e o Vanya são russos e estão de férias na Arménia, com os três filhos. Tomaram o pequeno-almoço no hotel onde eu estou – e por isso me viram a passear na aldeia de Halidzor – mas vão pernoitar noutro. Alugaram este carro e andam a viajar por várias zonas da Arménia.
Alugar um carro na Arménia é um bom sistema também, já que os transportes públicos são muito complicados e apenas para quem fala arménio ou russo. Eu sou a única turista de língua inglesa que vi viajar sozinha, em transportes públicos – que não são públicos, entenda-se, são privados, e servem o público. É uma autêntica aventura, e se não tivesse tido ajuda da população local, seria impossível. Digo mesmo: seria impossível, dado que as reservas são apenas feitas por telefone, e, conforme contei, desligam as chamadas a quem fala inglês, por não saberem falar inglês.
Neste momento o turismo de língua inglesa (entenda-se: de gente de todo o mundo) é apenas possível a quem aluga um carro, ou tem outro transporte como uma mota ou bicicleta, ou então inscrevendo-se em programas de agências de viagens.
Ou então, há uma última hipótese: é uma questão de arriscar, de ir para a paragem da marshrutka e esperar que haja lugar. Se não houver, pois terá que pernoitar onde está, à espera que haja lugar no dia seguinte. Enfim, não me parece agradável viajar assim, só para quem tem muito dinheiro e muito tempo de viagem.
E no meio deste discurso, faltou comentar esta foto: o filho da Nadya e do Vanya está a dar um pedaço de (shawarma? será uma shawarma?) ao cão, que anda a pedir comida às pessoas que passam. O cão comeu tudo, alface e tudo. Ainda apareceu outro também.
Fazemos uma paragem pelo caminho, para visitar a Torre de Vigia de Harsnadzor.
Esta torre é um exemplo da arquitetura militar arménia; a sua data exata da construção não é bem documentada, no entanto, acredita-se que a torre tenha sido construída durante a Idade Média, possivelmente entre os séculos XII e XIV. Este período foi marcado por várias invasões e conflitos na região, o que levou à construção de numerosas estruturas defensivas, como torres de vigia, castelos e fortificações, para proteger as rotas comerciais e as comunidades locais.
A vista do lado esquerdo.
A vista do lado direito.
Já aí vêm mais turistas.
E despedi-me desta simpática família; deixaram-me na aldeia de Halidzor. Aquele é o seu carro alugado.
São 13h35 e o Jivan vai levar-me a Goris. Ainda tenho que conhecer a cidade de Goris.
A escola de Halidzor.
São 14h26 e estamos agora nos escritórios das marshrutkas, onde eu compro o meu bilhete. Foi bom ter a ajuda do Jivan e agradeci-lhe a bela estadia que me proporcionou, e a deliciosa alimentação também.
3.000 drams (7,14€).
O Jivan regressa a Halidzor e à sua vida.
Ficou muita coisa por ver, nesta zona de Halidzor e Tatev. Já nem falo nas zonas mais distantes, aqui do sul. Passaria à vontade um mês, aqui, entretida todos os dias, com tantas coisas para ver e explorar.
Tirei esta foto para se ver como os canais de água, nesta cidade, têm tanta a água a correr.
Por esta altura um homem chamou-me e acenou-me. Eu olhei – é o taxista Matvei, da crónica 24! Eu fiz-lhe adeus também. Ele estava parado, em pé, junto ao carro, com outro homem. Hoje já me vê mais sorridente.
Chama-se Rosa, esta senhora. Há sempre uma Rosa em todos os países. Está a tomar conta da casa-de-banho pública (paga-se 100 drams, 0,24€), e veio ensinar-me que é aqui que se lavam as mãos.
Estes vendedores disseram-me os seus nomes: da direita para a esquerda: o homem é o Shaun; depois a Sushan, a Arev, e finalmente, na ponta esquerda, está a Silva! Também tem que haver um(a) Silva em todo o lado do mundo.
Comprei aquele saco de cerejas, 350 drams (0,83€). Também comi um ovo cozido, que sobrou do pequeno-almoço ontem, e uma parte do sweet sujukh – o restante ainda levei para Mush.
E cá está a minha marshrutka. Hoje há tanta gente para ir para Yerevan, que eles puseram duas. À frente está outra e irão fazer a viagem juntas.
Também regresso com muitos 4’s, o meu número da sorte. É bom que a viagem de regresso corra bem.
Desta vez fui no último banco, atrás. Todo só para mim. As duas marshrutkas dividiram as pessoas, e vamos bem espaçados; na minha vão apenas 9 pessoas.
Nem trinta minutos depois, faz muito sol e calor, tive que tirar o pullover verde e fiquei de tshirt, finalmente.
Vi pastores com rebanhos de vacas, e apicultores.
Meteu-se uma abelha dentro da nossa marshrutka, o condutor teve que parar e abriu a porta para ela sair. Nunca se mata uma abelha, elas estão a extinguir-se, com os humanos a cultivarem tudo e a colocarem pesticidas.
Na povoação de Armash (3h de viagem, por esta altura) todas as ruas têm vários postes, todos com ninhos de cegonhas, imensos. E depois na povoação de Surenavan, a mesma coisa. Só nesta foto veem-se 5 ninhos.
São 19h56 e chegámos à Southern Bus Station.
A estação de metro de Sassountsi David.
Cheguei às 20h20 à paragem dos táxis partilhados para Gyumri, junto à a estação de metro de Barekamutyun. Não há lugar nos táxis das 21h, ainda perguntei a um taxista que estava aqui parado. Ele telefonou para o escritório, perguntando se se arranja uma vaga para mim, mas disseram que não. Tive que esperar até às 22h, aqui sentada na rua, com este trânsito infernal, numa estrada com cinco faixas.
Três taxistas decidiram em que carro eu ia. Um mandou-me entrar, depois outro mandou-me sair e mudar de carro. Um deles falou com o escritório e disse que eu falo inglês – “angliski” – percebi claramente. Imediatamente telefonaram do escritório à Milena, a esta hora, dez da noite, a assustá-la, a dizerem-lhe que eu entrei no táxi errado por sua culpa, que ela tem que avisar que é para outra pessoa.
Valha-me Deus, estas pessoas da Yev-Yev são de uma maldade sem igual. Há necessidade de fazerem isto?
Tive eu que explicar à Milena que estou no táxi certo, que vou a caminho de Gyumri, e foi o taxista que me mandou entrar, após eu mostrar-lhe a minha reserva no telemóvel; e depois que me mandou sair, com todo o incómodo que isto causa aos passageiros, eu com cerejas, carregador do telemóvel, mochila, saco de plástico – tive que agarrar em tudo para mudar.
Fiz uma viagem com o ar ligado na intensidade máxima direito a mim, no lugar da frente. Eu nem me atrevi a dizer nada, senão eles ainda me expulsam do táxi. Pus a mão à frente do nariz para evitar respirar estas rajadas de ar frio. Uma senhora no banco de trás foi a tossir o tempo todo.
Quando cheguei a Mush, o taxista ficou parado a observar para onde eu ia. As pessoas dentro do táxi, todas à espera. Eu meti pelas traseiras dos meus prédios.
Que pesadelo, a Yev-Yev, um autêntico pesadelo e guardo muito más recordações disto. São pequenos negócios privados que reinam aqui dentro.
Cheguei às 23h50 ao estúdio. Por aqui fazem relâmpagos e chuva, como é hábito a esta hora. Depois do belíssimo calor de Yerevan, voltei a vestir o pullover verde de lã.
Deitei-me às 00h36.