Dia 16 – Em Yerevan: o Metro, Museu do Genocídio Arménio, Galeria Nacional, Mãe Arménia & Mesquita Azul
Às 6 da manhã vem um táxi partilhado buscar-me. Foi marcado através de uma aplicação que instalei no telemóvel, chamada “Yev-Yev”. Mas existem outros táxis partilhados, vim a saber: Faeton, Ejan, Lav, Maxi.
São 4h24.
Por mais incrível que pareça, dormi oito horas entre as 20h e as quatro da manhã.
A esta hora estava um homem na rua à espera de um carro. Às 4h30 passou um camião de limpeza, a deitar uma espécie de spray pela estrada, a lavar e talvez desinfetar.
Eu estou a usar uma vela porque não me apetece ligar as luzes fortíssimas e brancas do estúdio, conforme expliquei na crónica 3: estas luzes estão preparadas para algum artista trabalhar à noite, se assim o desejar. Fazendo-me falta uma luz fraca, amarela, para a noite, comprei velas aqui em Mush.
O pequeno aquecedor elétrico também se avariou, ontem. Durou 9 dias. Liga, e desliga-se imediatamente, trabalha apenas dois segundos. Felizmente já está mais calor de manhã, na ordem dos 15°, e eu estou praticamente curada da constipação. Perguntei aos responsáveis da residência, por Telegram, se ele está em garantia, ou se vão mandar um técnico reparar o aquecimento do estúdio, mas nunca recebi resposta.
Às 5h38 eu estava despachada. Às 5h42 o motorista ligou-me. Não fala inglês; disse-me “Mercedes” e “Victor”. Eu desci os cinco andares imediatamente. Entrei para o carro em primeiro lugar, fui a primeira passageira que ele apanhou, e fui à frente. Ainda irá outro passageiro à frente, no meio.
Agora vamos apanhar os restantes passageiros nas várias localidades, em suas casas.
Os cães estão a brincar. Estiveram a brincar algum tempo, e eu a observá-los. Estávamos parados na carrinha, à espera que um passageiro descesse da sua casa.
Levámos 45 minutos a recolher os restantes sete passageiros, todos homens. Éramos nove com o motorista. Partimos às 6h30 para Yerevan, portanto. Esta foi a rua onde eu encontrei a cadelinha, na crónica 4.
À direita fica o Velho Cemitério de Gyumri, que visitei nessa crónica 4.
Foram todo o caminho a conversar, o motorista e este passageiro ao meu lado.
Chegámos às 8 horas a Yerevan. Os passageiros do meu táxi partilhado estão a pagar a viagem. Eu paguei logo mal entrei, ainda não conheço estes procedimentos.
Tal como o Hakob me ensinou, o táxi partilhado deixou-nos na estação de metro Barekamutyun. Esta palavra significa “Amizade”. É a estação de metro da amizade.
Não muito amigável foi o polícia que se vê lá ao fundo, com a mão levantada, a dizer que não posso tirar fotos. Há fotos até na Wikipédia, desta estação de metro, todos os turistas tiram fotos do metro de Nova Iorque e de outros metros no mundo, mas na Arménia é um problema fotografar uma estação de metro. Ainda por cima é uma estação bonita e deviam orgulhar-se dela, com muitas fotos, não escondê-la. Mas não é vão que a Arménia é considerada, em termos de desenvolvimento turístico, em estado “emergente”. É muito assustador ainda, receber um turista interessado no seu metro. O polícia forçou-me a apagar a foto, imagine-se. Também não quero que o homem seja despedido, é bom referir isto. Eu é que fui matreira e não a apaguei, fui para outros menus estranhos; os menus estão em português, ele não percebe nada. E ainda tirei outras tantas, à socapa, com o telemóvel, que se podem ver abaixo. Há uma funcionária dentro da estação, em pé, a controlar tudo. No fundo das escadas rolantes há outra funcionária a olhar para nós, sentada dentro de uma cabine. Tirar fotos no metro da Arménia é uma autêntica aventura de risco, é coisa para uma espiã profissional como eu.
O metro de Yerevan foi inaugurado em 1981, com 5 estações então. Nas décadas de 1980 e 90 foram construídas as restantes. Atualmente, a ferrovia tem uma extensão de mais de 12 km, com 10 estações. Em 2010 sofreu um processo de renovação através de fundos recebidos do Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento, bem como da Plataforma de Investimento de Vizinhança da EU (EU Neighborhood Investment Platform). Funciona de segunda a sexta entre as 6h30 as 23h, e sábados e domingos entre as 7h e as 23h. O preço do bilhete é 100 drams (0,24€).¹
Dei uma moeda de 100 drams, na bilheteira, e deram-me uma moeda de plástico, como as dos carrinhos dos supermercados, em Portugal. O polícia ainda teve de ajudar-me a passar nas cancelas, porque eu estava a tentar passar noutra cancela que não aceita estas moedas. Só a da ponta é que aceita, e eu bem que procurava a ranhura para meter a moeda.
A Praça da República.
Uso a aplicação “Maps.me” para deslocar-me em Yerevan. Para já tenho que ir ao hotel que reservei ontem – fica a 850 metros, 11 minutos a pé. Vou lá deixar o saco que trouxe com as minhas coisas: a escova de dentes, os meus produtos de higiene, os carregadores, uma muda de roupa para amanhã. Vim com um saco de plástico. Viajar com um saco de plástico na mão é mesmo miserável; mas a minha mochila laranja (que vê na crónica 1) é grande demais e pesada; e a mochila azul que uso às costas, durante os passeios de bicicleta, é pequena, não cabe tudo. Vim mesmo com um saco de plástico na mão.
A aplicação “Maps.me” diz-me que tenho de apanhar o autocarro 57 para o Museu do Genocídio, a minha primeira visita em Yerevan. Começo pelo grau de importância: não posso ir embora da Arménia sem visitar este museu, e por conseguinte é já a primeira visita, para ficar garantido. A paragem é mesmo em frente ao hotel, onde eu estou – onde está a seta azul. E mal cheguei à paragem, veio logo um. Vou passar novamente na estação de metro Barekamutyun.
São agora 9h28. O museu abre às 10. Está nublado, mas faz muito calor. Besuntei-me toda com protetor solar, hoje às cinco da manhã, mas nem vou ver o sol. O clima em Yerevan não tem nada a ver com o de Gyumri: aqui fazem trinta e tal graus todos os dias, é um calor maravilhoso, aqui não há constipações.
Passou das 10h e o museu não abre, nem se vê ninguém. Então?
Até que passaram dois homens, e eu perguntei se o museu não abre hoje. Disseram-me que ali não é o museu: fica atrás daquele edifício. E um deles ofereceu-se para me levar lá. Segui-o.
Aqui está o senhor que me levou ao museu – chama-se Arkadi, não fala inglês, é russo, e trabalha naquele edifício onde eu estava, que é um complexo desportivo. Vim a saber mais tarde que é engenheiro eletromecânico e que se formou na Universidade de São Petersburgo. E entretanto ele não sabia onde era a entrada do museu. Ou melhor, ele sabia, mas a entrada estava fechada e ele foi ver se havia outra. Enquanto ele andava à procura, eu perguntei a esta rapariga – que se chama Vlada – se ela sabe onde é a entrada. A Vlada, também vim a saber mais tarde, também é russa, é turista, fala bem inglês, e vai começar o 3º ano na universidade, no curso de Publicidade e Relações Públicas, na Rússia. A sua irmã está a trabalhar aqui na Arménia, e ela veio passar uns dias com ela. Neste momento a irmã está a trabalhar, e a Vlada veio dar um passeio. Regressa já amanhã à Rússia.
E então a Vlada também não sabe onde é a entrada do museu. A entrada deste museu foi um autêntico mistério no início, e já outras pessoas também lhe tinham perguntado, disse-me ela.
O mistério deveu-se simplesmente ao facto da porta estar fechada – é necessário descer umas escadas, mas já passava das 10h e a porta estava fechada.
O Arkadi levou-nos então, a mim e à Vlada, enquanto a porta abre e não abre, a outro edifício ao lado, onde visitámos esta maravilhosa exposição de pintura, do pintor franco-arménio Jean Jansem (Hovhannes Semerjian), (1920 – 2013). A placa exposta no museu, que apresenta o artista, indica, entre muitas outras coisas, que devido ao genocídio arménio, em 1922 os pais de Jansem fugiram para a Grécia. Em 1931, após a morte do pai, o jovem Jansem, então com 11 anos de idade, foi viver para França, com a sua mãe, onde viria a formar-se em Belas-Artes.
Nesta sala estão expostos outros autores que também abordam o genocídio arménio nas suas obras, nomeadamente esta pintora Silva Arakelian, nascida em Istambul, e formada aqui – em Istambul, e na universidade Sorbonne, em França. Achei curioso o nome “Silva”, tão português. Infelizmente a foto ficou com brilho.
E agora sim, entramos no Museu do Genocídio propriamente dito. O Arkadi acompanhou-nos toda a visita. Ele interrompeu o trabalho, para onde ia quando me apanhou, e veio visitar o museu connosco. Nunca chegámos a perceber, eu e a Vlada, quais são as suas funções no complexo desportivo – ele disse que fazia um pouco de tudo, mas sejam quais forem, ele pôde ausentar-se hora e meia, o tempo que estivemos a visitar o museu.
Uma das placas na entrada do museu indica:
“Depois de chegar ao poder em 1908, a liderança do partido dos Jovens Turcos defendeu a ideia de que “a salvação da pátria turca” poderia apenas ser atingida através da liquidação da população cristã no Império. O 4º Congresso do partido, em 1911, confirmou a necessidade de islamização da população. Isto exigiu a turquificação forçada da população e, no caso de falhar, à exterminação dos cristãos.”
Os horrores que se passaram durante o Genocídio Arménio (1915-1923) são indescritíveis. Estima-se que morreram 1 milhão e meio de pessoas. Foram assassinados por tropas turcas, em campos de concentração, queimados, enforcados e até mesmo afogados no rio Eufrates, mas a maior parte dos arménios morreu por inanição, ou seja, falta de água e alimento².
Existem muitos artigos na internet sobre o genocídio, no entanto encontrei um bom resumo, em português, retirado de uma revista de História: link. Este artigo é de 2009, e entretanto, em 2021, o presidente americano Joe Biden já reconheceu o massacre como “genocídio” (o artigo de 2009 ainda diz que não).
O artigo indica ainda:
Além de causar a morte de milhões de pessoas e quase exterminar um povo, o genocídio também provocou uma grande diáspora. Hoje, além da população de 3,5 milhões de pessoas da República da Arménia, estima-se que cerca de 2,6 milhões de arménios e descendentes vivam na Federação Russa e na República da Geórgia, e pouco mais de 2,5 milhões estejam espalhados pelo resto do mundo, principalmente nos Estados Unidos, Canadá, França, Irão, Argentina, Líbano, Síria e Austrália. (…) Não importa onde estejam, a luta dos arménios hoje é uma só: o reconhecimento do genocídio pelo mundo.²
Esta foto tirou-ma a Vlada, sem eu dar conta. Depois enviou-ma por Whatsapp. Eu tenho a máquina fotográfica ao pescoço, mas estou a fotografar com o telemóvel porque é mais prático. Fiquei com muitas fotos, e muitos textos fotografados, com informação, que não ponho aqui na crónica porque já está muito longa. Vocês, caros leitores, têm que ir ao museu ver com os vossos próprios olhos.
A mulher que se encontra na foto do meio, em cima, chamava-se Bodil Katharine Biorn (1871-1960), uma missionária norueguesa que foi enviada em 1905 pela organização Womens Missionary Workers para Mush, onde fundou um hospital e trabalhou no orfanato. Ela salvou inúmeras mulheres e crianças durante o Genocídio Arménio. Em 1922 fundou um orfanato em Alexandropol – que era o antigo nome de Gyumri, conforme expliquei na crónica 9.
Destaco esta missionária pelo facto de ter estado em Mush – e é isto que quero explicar agora: esta povoação “Mush” era a primeira Mush, a mais antiga. Eu estou alojada em Mush 2.
Mush foi um importante centro histórico e cultural na história arménia. Fazia parte da Arménia Ocidental, no século IV, e passou mais tarde para a Turquia. Em 1915 Mush situava-se na Turquia, e foi uma das povoações que a Turquia aniquilou durante o genocídio. Antes do genocídio contra os arménios, existiam aí 299 igrejas, 94 mosteiros e 135 escolas. Em 1914, 75.623 arménios viviam em Mush, espalhados por 103 aldeias e cidades. O antigo Mush Arménio foi um dos centros importantes da província de Taron. A antiga cidade arménia de Taron foi o centro do cristianismo primitivo na Arménia Ocidental. Após o genocídio de 1915 e a eliminação da população arménia na cidade, a arquitetura da cidade também foi destruída. A propriedade arménia foi dispersada, escolas, igrejas e mosteiros foram destruídos ou usados para outros fins.³ Hoje é uma cidade na Turquia, maioritariamente habitada por curdos.
Atualmente a Arménia deu o nome de Mush à nova povoação, em Gyumri, criada após o terramoto de 1988: existe um Mush 1, construído após o terramoto de 1988, que ainda é habitado, porém fica longe do centro de Gyumri, e as pessoas optaram por construir Mush 2, a partir de 2012, mais perto da cidade.
Nota:
Agradeço a ajuda da Nelly (crónica 13) e da Leila (crónica 9) com todas as explicações, e todos os links que me enviaram, através do WhatsApp, para eu perceber a história de Mush. Tivemos grande troca de mensagens, e isto exigiu-lhes tempo e paciência (eu a escrever em arménio, a Nelly a responder-me em português e inglês, e a Leila a responder-me em arménio, que eu ia traduzindo com o tradutor Google). Deixo alguns links que a Leila e a Nelly me enviaram, sobre estes temas, porque foi muito difícil eu encontrar informação, a qual existe maioritariamente em arménio e russo, na internet:
Assentamentos da Arménia Ocidental: Mush
Arménia Ocidental
Mush – Link 1; link 2; link 3
E depois do difícil Museu do Genocídio, cada qual segue o seu caminho. São agora 11h24. Trocámos de WhatsApps e despedimo-nos; foi uma companhia improvisada bastante simpática. O Arkadi ainda perguntou se queríamos ir visitar o Complexo Desportivo. Disse-nos que não está aberto a visitas, mas que ele poderia fazer-nos uma visita ao interior. Eu tenho uma agenda tão cheia, nestes dois dias, que tive que recusar. Gostaria de ter visitado, todavia. E a Vlada foi visitar um grande centro comercial que existe aqui ao lado – vimo-lo à distância, de cima.
Apanhei o 33 para a Galeria Nacional, o meu próximo destino.
Reparem no sinal: proibido buzinar.
“Armenian State Philarmonia – Arno Babajanyan Concert Hall”, diz na placa. Desta vez não planeei concerto nenhum. Nestas capitais eu gosto sempre de ir a um concerto, ou fazer uma visita organizada aos bastidores.
A Galeria Nacional
O último andar – por onde se começa a visita – é dedicado ao artista marítimo Hovhannes Aivazovsky (1817-1900). A sua família era de origem arménia, e residia do porto de Teodósia, na Crimeia, na altura pertencente ao Império Russo, onde nasceu. Estudou na Academia Imperial de Belas-Artes em São Pertersburgo.
“Tempestade”, 1872.
A placa indica:
Aivazovsky como viajante
Em 1837, a Academia de Artes de São Petersburgo concedeu a Aivazovsky uma medalha de ouro e proporcionou-lhe a oportunidade de aperfeiçoar-se no estrangeiro. Em 1840, partiu para Itália, viajando também para Inglaterra, Países Baixos e França. Esta viagem teve um impacto imenso na formação da estética e do método criativo do artista.
Em 1868, Aivazovsky foi ao Cáucaso, e em 1869 participou na cerimónia de abertura do Canal de Suez. Aos 75 anos, fez a viagem mais distante da sua vida, viajando para a América de barco a vapor com a sua esposa, Anna Burnazian.
A arte deste grande pintor marinho foi admirada em todo o lado, e ele colheu os louros durante a sua vida. Aivazovsky foi eleito membro das academias de Paris, Roma, Amesterdão, Florença e Estugarda, foi condecorado com a Legião de Honra francesa e recebeu outras altas distinções. O artista realizou exposições em várias cidades russas, europeias e americanas.
“Mulher nº 1”, 2044, de Kamo Nigaryan (1950 – 2011)
Kamo Nigaryan é um representante do chamado grupo ‘dissidente’ de artistas arménios que veio à tona durante a década de 1970. Graduado pela Faculdade de Design do Instituto de Belas-Artes e Drama de Yerevan, a sua reputação como um dos mais importantes pintores arménios contemporâneos está bem estabelecida, principalmente após sua primeira exposição individual na Artist’s House em Yerevan em 2000. Mas a sua prática como fotógrafo continua pouco conhecida.⁴
Secção de pintura antiga e medieval arménia, com pinturas desde o século XIII.
Perguntei a uma rapariga que ia a passar na rua por um restaurante barato e com comida tradicional arménia, fora desta zona turística. Ela deu-me o mais turístico de todos; tirei esta foto da Praça da República, na esplanada do restaurante, e fui-me embora, tinham preços na ordem dos 5000 e 6000 drams. Outra deu-me um café que não tinha almoços, só pizzas, e disse que ali havia comida tradicional Arménia. Está complicado.
Uma hora de estacionamento custa 300 drams (0,71€). 1 dia custa 2.000 drams (4,76€).
Acabei por comer na avenida central, um pouco mais barato, 2700 drams (6,43€), com uma bebida, água ou cola, incluída.
Muito bom, os legumes salteados souberam-me muito bem. Esta foi a primeira vez que comi batatas fritas na Arménia. E última – não voltei a comer batatas fritas na Arménia.
São 14h03.
Apeteceu-me fruta como sobremesa, mas não sei de frutarias no centro. Vim a descobrir depois que estava a 500 metros do meu hotel, com a frutaria e o supermercado ao lado. Estes bolos têm um aspeto apetitoso, mas considerei muito grandes para uma sobremesa.
À laia de sobremesa, bebi este sumo.
São 14h45 e desta vez vou de Yandex Taxi para a minha próxima visita: a “Mãe Arménia”. Esta visita foi sugerida pelo Mkrtich Tonoyan, um artista arménio com quem me vou encontrar agora, para nos conhecermos. Para chegar lá seria necessário fazer um quilómetro a pé, apanhar um autocarro, e depois fazer outro quilómetro a pé. Fecha às 16h30 e tenho o encontro marcado, pelo que optei por chamar um táxi (900 drams, 2,14€). A viagem leva 15 minutos.
Conforme expliquei na crónica 4, ao visitar a “Mãe Arménia” de Gyumri, esta estátua é um tributo ao papel das mulheres na defesa e na manutenção da paz no país.
O museu que existe na base da Mãe Arménia, dedicado à história militar da Arménia. Tem secções dedicadas à Primeira Guerra Mundial e ao Genocídio Arménio, à Segunda Guerra Mundial, e à Guerra de Nagorno-Karabakh.
A placa indica:
E assim começou
Na segunda metade da década de 1980, a política de “perestroika” (que significa literalmente “reestruturação”) de M. Gorbachev começou na União Soviética, com o objetivo de realizar reformas internas e a democratização da sociedade, o que renovou as esperanças do povo arménio na restauração da justiça histórica.
Os arménios, na luta pelo direito de viver na sua pátria histórica, escolheram formas civilizadas de resolver a questão: encontros pacíficos, manifestações em massa e greves, apelos às autoridades superiores exigindo o respeito pelo direito à autodeterminação da população arménia, a maioria nacional na Região Autónoma de Nagorno-Karabakh, em conformidade com a constituição da URSS.
Em resposta a isto, no final de fevereiro de 1988, as autoridades do Azerbaijão Soviético organizaram massacres bárbaros e a deportação forçada de mais de 350.000 arménios em Sumgait, Kirovabad, Baku e outras cidades.
Ora digam-me lá que não são parecidos aos portugueses? Eu nunca vi um povo tão parecido aos portugueses como os arménios.
Este é o parque ao lado da Mãe Arménia existente há muitos anos, contou-me o Mkrtich Tonoyan, que deve estar aí a chegar. Ele vinha aqui na sua infância, disse-me. Chama-se “Parque Vitória”.
Cá está o artista arménio Mkrtich Tonoyan, que me foi apresentado pela também artista Nia Pushkarova, diretora da residência artística da Bulgária, onde eu estive no ano passado. Quando eu lhe contei que agora vinha à Arménia, ela falou-me do Mkrtich. Troquei alguns emails com este, e tentámos agendar um encontro em Yerevan, na sua atribulada agenda. O Mkrtich parte para a Grécia dentro de poucos dias, e a seguir vai para a França, onde está a tratar de uma série de eventos artísticos.
Eis o seu website: https://tonoyan.com/
O Mkrtich Tonoyan nasceu em 1974 e formou-se na Academia de Belas-Artes de Yerevan. Citando o seu website: “Em 1990-1994 participei da guerra de Artsakh [Nagorno-Karabakh], passei por horrores, mortes, destruições, deceções e emoções, perdi muitos dos meus melhores amigos…”.
Posteriormente o Mkrtich decidiu ficar no exército e passar a sua experiência de combate para jovens soldados. Citando novamente o seu website: “(…) era o único lugar onde eu podia estar, porque eu só tinha essa experiência. Só conseguia falar sobre guerra, e conviver com as lembranças da guerra foi difícil para mim. Foi então que encontrei uma forma de libertação – a arte.”
A partir de 1994, foi assistente do famoso artista arménio de vanguarda Alexander Melkonyan, o fundador de uma nova corrente conceptual de arte na Arménia, chamada “Arte Militar”.
Em 2002, juntamente com os seus amigos, fundou a ONG cultural Akos e desde então tem trabalhado na área artística, criando e implementando projetos de arte contemporânea, participando em muitas exposições e outros eventos locais e internacionais. Em 2006, esta ONG criou o programa de residência artística internacional “ACOSS AIR”, na Arménia, onde o Mkrtich é diretor.
Uma das obras de Mkrtich Tonoyan (2012, 18th Street Arts Center, EUA).⁵
Leio o seguinte na internet:
”A minha prática é um desacordo com as atuais estruturas de poder do mundo e uma tentativa de investigar causas, realizar resistência e promulgar mudanças. (…) A Arte Militar baseia-se na filosofia existencial para perceber o mundo por meio da “cultura” e da “estética” militares. Ao estudar a guerra, os artistas podem encontrar o caminho para interromper e desmantelar o pensamento militar que continua a controlar nosso mundo.”⁶
O Mkrtich tem quatro filhas, entre os 7 e os 23 anos. Vive com cinco mulheres, portanto. Depois da experiência de guerra, na juventude, eis que se vê rodeado de mulheres, atualmente, na sua vida, para lhe atenuarem tudo o que passou. (Também não deve ser fácil viver com cinco mulheres, digo eu!!)
Despedi-me do Mkrtich, agradeci o nosso simpático encontro, e este acompanhou-me até à outra ponta do parque, para mostrar-me estas escadarias, que eu posso descer e ficar no centro da cidade. São agora 17h20 e 572 degraus até lá abaixo. O edifício ao centro é a Ópera.
“Cascade Steps”, também conhecido como Cafesjian Center for the Arts. Por esta altura eu não sabia que estas escadarias albergam uma série de esculturas de artistas internacionais, a céu aberto. Eu não quero forçar muito o meu pé, onde tenho um tendão refilão já há muito tempo. Então considerei melhor não descer estas escadas todas e decidi apanhar o autocarro para o meu próximo destino. Tenho que voltar a Yerevan, um dia, para descer estas Cascades.
(Foto retirada de Visit Yerevan)
São 18h15 e entro na minha última visita de hoje: a Mesquita Azul.
A religião predominante na Arménia é o cristianismo. Cerca de 98% da população é cristã. Historicamente, foi a primeira nação a adotar o cristianismo como religião de Estado, no ano 301. Hoje o país é constitucionalmente um Estado laico. Esta mesquita é uma raridade turística, em Yerevan, portanto.
É um edifício muito bonito, mas esta filosofia que lhe está associada não é propriamente positiva. Um leão tem vergonha do seu corpo? Uma águia tem vergonha do seu corpo? Porque tem um ser humano de esconder o seu corpo? Algo nestas religiões não funciona bem. Não é só o islamismo, são outras também; na Índia tive igualmente que esconder o meu corpo para visitar alguns templos de outras religiões. Eu não tenho que esconder o meu corpo nem o meu cabelo, eu não tenho que envergonhar-me de nada, em mim. Estas religiões não estão corretas e estão desatualizadas no tempo.
São 18h37 e vou finalmente para o hotel, é hora de descansar. Acordei às 4 da manhã e estou em viagem desde as 5h45, há quase treze horas, portanto. Foi um dia muito intenso e maravilhoso, correu tudo bem.
São 2 km até ao hotel, e não me apetece caminhar tanto. Meti-me no primeiro autocarro que apareceu e fiz um quilómetro nele, até ele virar para uma rua que iria afastar-se do meu hotel. Não faço ideia para onde vai o autocarro. O bilhete custa 100 drams (0,24€) e as pessoas só pagam no final da viagem, é curioso. Saem frequentemente pela porta de trás, e depois entram pela porta da frente para deixar os 100 drams ao motorista, e voltam a sair. Não há bilhetes. Este sistema de pagamento funciona na base da confiança, portanto. Quem não lhe apetecer, não paga. Eu, que ainda estou verde nisto, deixo logo os 100 drams à entrada. Mas uma vez entrei pela porta de trás (também se pode entrar pela porta de trás) e dei-me a esse trabalho: quando terminei a viagem, voltei a entrar pela porta da frente, deixei a moeda junto ao motorista, e voltei a sair. Em terra de arménios, faz o que os arménios fazem.
Novamente a Ópera de Yerevan.
Comprei um litro de leite e um pêssego gigante, de 420 drams (1€). A fruta aqui é caríssima, comparada com a de Gyumri. Depois acabei por não o comer, só bebi leite. E o leite é metade do preço do de Gyumri, anda pelos 450 drams o litro. Em Gyumri é 850 o mais barato.
É um quarto apenas para uma noite. Não tem janelas e o teto é baixo, mas serviu os seus propósitos: fica bem no centro de Yerevan, é confortável, serviu um bom pequeno-almoço, como prometia, e ficou em 17.550 drams (42€). Até tem frigorífico, para o meu pacote de leite. Eu não trouxe chinelos e o hotel tem uns chinelos de pano e papel, de cortesia.
¹ “History of Yerevan Metro” (s.d.). Município de Yerevan. Página consultada a 19 de agosto 2024,
https://www.yerevan.am/en/metro/
² Vasconcelos, Y. (julho 2009). “Genocídio armênio”. Revista Aventuras na História. Página consultada a 19 de agosto 2024,
https://web.archive.org/web/20090903154857/http://historia.abril.com.br/guerra/genocidio-armenio-434250.shtml
³ “Արևմտյան Հայաստանի բնակավայրերը.Մուշ” (10 maio 2022). TV Arménia Ocidental. Página consultada a 19 de agosto 2024,
https://westernarmeniatv.com/hy/culture_am/%D5%A1%D6%80%D6%87%D5%B4%D5%BF%D5%B5%D5%A1%D5%B6-%D5%B0%D5%A1%D5%B5%D5%A1%D5%BD%D5%BF%D5%A1%D5%B6%D5%AB-%D5%A2%D5%B6%D5%A1%D5%AF%D5%A1%D5%BE%D5%A1%D5%B5%D6%80%D5%A5%D6%80%D5%A8-%D5%B4%D5%B8%D6%82/
⁴ “Nigaryan, Kamo” (s.d.). Lusadaran – Fundação Arménia de Fotografia. Página consultada a 19 de agosto 2024,
https://lusadaran.org/artists/kamo-nigarian/
⁵ 18th Street Arts Center (2012). “Mkrtich Tonoyan – Exhibition & Residency”. Página consultada a 19 de agosto 2024,
https://18thstreet.org/artists/mkrtich-tonoyan/
⁶ Candyland (2023) “Mkrtich Tonoyan – Military art, Art for Defence”. Página consultada a 19 de agosto 2024,
https://candyland.se/?p=3953