05 – Visita à comunidade Roma

Estes dois supermercados existem mesmo ao lado do hotel, a uns duzentos metros. Do lado oposto àquele em que eu me dirigi esta manhã.

E será aqui que virei buscar o meu almoço todos os dias. A residência artística forneceu variados alimentos: desde carne, vegetais para saladas, azeite, vinagre, sal, ovos, feijão, massa, atum, iogurtes, queijos, cereais, fruta, e sei lá que mais. Eu também levei alguns alimentos comigo, de Portugal, nomeadamente cereais do pequeno-almoço. Já são alguns anos de experiência, a viajar, e eu gosto de ter um pequeno-almoço rápido, bem cedo, logo às seis da manhã, ou mesmo antes, e também gosto de comer os meus cereais preferidos, sem me sujeitar à estranha – ou escassa – oferta que poderá existir nas zonas de destino. E ainda levei três latas de comida para desenrascar em alguma urgência, contendo almôndegas, salsichas vegetarianas (estas duas latas foram horríveis, não voltarei a comprá-las…) e outra de sardinhas.
Nem me dignei a procurar restaurantes em Lom, não quis perder tempo. Tenhamos em conta que eu estou a fazer uma residência artística, não estou propriamente de férias. Eu acordava todos os dias cerca das 6 da manhã (amanhecia às 5h30 e anoitecia quase às 22h) e começava a pintar às 7. Interrompia para almoço, e continuava a pintar até cerca das 16h ou 16h30. Não tinha a mínima vontade de demorar-me em restaurantes, ou de perder tempo sequer a procurá-los. Este supermercado deu-me um jeitaço muito grande. E assim gastei muito pouco dinheiro em comida, portanto, pois fui consumindo também o que a residência oferecia. Em breve mostrarei as refeições do supermercado (boas, inclusive com comida tradicional búlgara), bem como os preços. Por esta altura eu não imaginava que iria escrever crónicas, e ainda não fotografava a comida, como é hábito.
Uma nota: quem acompanhou as últimas crónicas, das últimas viagens, talvez se lembre que eu não janto. Eliminei essa refeição do meu mapa. Deixei de jantar há alguns anos, o organismo desabituou-se. É comida a mais, a partir de certa idade tornam-se desnecessárias tantas refeições por dia. (Este tema dá para pano para mangas, calculo, mas não é agora a altura propícia para desenvolvê-lo; concentremo-nos em Lom).

Aqueles três litros de leite são meus. Efetivamente gastei uma pequena fortuna em leite, nesta estadia, pois este é muito caro na Bulgária. Um litro anda pelos 2€ (4 leva e pouco), uma coisa abismal. (Recordo que a moeda na Bulgária é o lev, e que no plural se diz “leva”. O câmbio que estou a usar é 1 lev = 1,96 euros). E eu bebo mais de um litro de leite por dia. Só nos cereais do pequeno-almoço vai quase um pacote inteiro. Enfim, em Portugal eu compro leite das ilhas dos Açores por 0,80€, e já está quase ao dobro do que era antes, andava pelos 0,49€, antes desta maldita guerra da Ucrânia. Por conseguinte, há alguns meses atrás, eu comprava 4 litros de leite com 2€. Aqui na Bulgária compro só um.

As minhas primeiras pinturas. Comecei com amarelos e verdes.

O Voin de Voin e a Kat Pegler a comprarem uma melancia. O vendedor está a pesá-la. Íamos a caminho do próximo evento, na comunidade Roma, no carro do Voin.

Esta visita à comunidade Roma enquadra-se numa das iniciativas do projeto “Music Art Tabor”, que visa a inclusão das comunidades ciganas na dinâmica da vida artística contemporânea. Na plataforma de cidadania “Nossa Europa”, encontro a seguinte explicação:

“Por “roma” designam-se as populações de etnia cigana, que conta com cerca de 12 milhões de pessoas na UE, a maior minoria étnica da União desde a adesão da Bulgária e da Roménia.
O termo “roma” foi adotado na primeira conferência internacional de grupos de etnia cigana que reuniu em Inglaterra em 1971. De lá para cá foram realizadas mais sete conferências. Ao longo destes oito momentos, os representantes da comunidade romani discutem formas de preservação da língua romani, a integração das comunidades nos países de acolhimento, entre outros assuntos.”¹

O jornal Público, por seu turno, explica:
“Há muitos subgrupos. Os ciganos portugueses, por exemplo, são de ascendência roma, sinti, manouch, cale. Como a palavra ciganos – ou upzigeuner, gipsy, gitan, gitano, tsigane, cygan, cigá, noutras línguas – tem uma carga negativa, nalguns sítios funciona mesmo como um insulto, diversas instâncias internacionais adoptaram o termo roma. Roma é, em suma, a palavra politicamente correta para cigano. É usada em encontros e relatórios, por exemplo, do Conselho da Europa e do Parlamento Europeu. Em Portugal, ainda não entrou no uso corrente. O politicamente correcto serve-se da expressão “pessoas de etnia cigana”.²

Foi um final de tarde muito agradável, com música belíssima e alegre, e eu dancei ainda um pouco, também, de mãos dadas com as pessoas, desajeitada com os passos da dança tradicional. Mal ou bem, dancei.

Entretanto eu a Kit Wai Lam, a artista de Hong Kong, fomos embora num táxi até ao hotel. Foram 5 minutos de viagem e pagámos 3,20 leva, ou seja 1,60€ – o que deu 0,80€ a cada. Os táxis são mesmo baratos na Bulgária. Pago mais pelo leite, do que pelo táxi. E eis que os nossos colegas que ficaram no evento tiveram oportunidade de assistir a um fenómeno raríssimo: caiu um meteorito a uns 50 km de Lom. Deu nas notícias, e no início pensava-se que era um avião a cair, com problemas técnicos. Pelo que percebi, alguns dos nossos colegas conseguiram ver o clarão no céu. Eu e a Kit também o poderíamos ter visto, claro, bastaria estar a olhar o céu. Mas não, eu fui para o meu quarto, e a Kit foi para o seu (estávamos as duas na mesma casa). Segue um vídeo da Euronews que mostra o meteorito a cair. Só faltava morrermos todos na Bulgária com um meteorito em cima!, esta residência artística ficaria na história. Este episódio viria a influenciar uma das residentes, a pintora búlgara Mariana Tantcheva, que habitualmente já incorpora no seu trabalho a temática de explosões. Desta vez pintou mesmo um meteorito a cair, para a exposição final desta residência. Em breve publicarei fotos da exposição, numa crónica futura, e poderão ver.


¹ Coelho, C., & Jesus, A. (s.d.) “Roma”. Plataforma de Cidadania “Nossa Europa”. Página consultada a 9 agosto 2023,
https://nossaeuropa.eu/definitions/view/862

² ACP (26 agosto 2010). “Roma é igual a cigano?”. Jornal Público. Página consultada a 9 agosto 2023,
https://www.publico.pt/2010/08/26/jornal/roma-e-igual-a-cigano-20085447

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