186 – Uma das Tribos Locais
A constituição da Índia reconhece a existência de 645 tribos. São os “upajati (literalmente, clãs, tribos, grupos). Pertencem às “Scheduled Tribes”, ou seja, são considerados dalits ou intocáveis (ver crónica 73 sobre esta matéria). Foi com enorme curiosidade que os avistei, enquanto fazíamos o bamboo rafting, e pedi para pararmos. Infelizmente o seu à vontade foi totalmente condicionado pela presença do restante grupo: os guardas, que aparentemente não queriam parar (eu devo ter dito umas três vezes que queria parar, e estava a ver-nos a passar demasiado ao largo para meu gosto…) e o Gregory, o alemão, que estranhou imenso o meu interesse pela tribo e nem se atreveu a sair da canoa. Se eu estivesse sozinha com eles o contacto seria diferente, tal como foi aliás no resto das povoações por onde andei. As pessoas metiam-se comigo, chamavam-me até. Assim, com guardas e turistas especados a olhar, de longe, houve um certo embaraço da sua parte, como é natural. É pena.
Vejo na Wikipédia que em Kerala existem 37 tribos. O meu programa de viagem refere de facto duas tribos nestas florestas de Periyar: os Mannan e os Uraly. Se bem me recordo, os guardas disseram-me que este grupo pertencia aos primeiros. Os Mannan são excelentes pescadores, e alguns deles ainda praticam a tradicional – e perigosa – recolha de mel das grandes e mortais abelhas das montanhas. Os Uralys constroem casas nas árvores, não como residências mas como torres de vigia para manter os javalis e os elefantes longe das suas colheitas.
De facto não faz sentido que estas tribos tão antigas na Índia sejam metidas no mesmo saco dos “sem casta”, dos “intocáveis”. Conforme referido na crónica 73, os critérios de classificação basearam-se no estilo de vida ligado à agricultura primitiva, economias fechadas de baixo valor, baixo nível de tecnologia, literacia e saúde, o que as conduz no geral à pobreza. Naturalmente que as tribos não aceitam pertencer aos intocáveis, e consideram terem sido para aí empurradas pelo governo e pelos hindus à falta de melhor categorização. Uma coisa são os dalits que vimos nas cidades do Rajastão, com vidas miseráveis, rotos, magros e esfaimados, a pedirem junto aos semáforos, no meio do trânsito, e outra coisa é ver uma tribo a viver na floresta, com longas tradições e riqueza cultural. Digam-me que a rapariga da sexta foto abaixo está mal encarada, triste e esfaimada.