153 – Um Cemitério Hindi

Conjugar o bom tempo em duas regiões tão distantes uma da outra, Rajastão e Kerala, não foi pera doce. Eu queria um ponto comum em ambas: calor. E não queria um ponto comum em ambas: chuva. A viagem oscilava entre Junho e Julho, mas por causa das monções de Kerala teve de ser antecipada para Maio. E mesmo assim as monções começaram mais cedo do que o previsto, conforme se pode ler na notícia do jornal, abaixo. Ou seja, amanhã tenho um dia inteiro de trekking pelas montanhas, e há fortes probabilidades de chover. Já tem estado a chover, mas pouco. Uma chuvita aqui e além. Ou melhor, uma chuvada torrencial que dura dois minutos e vem o sol outra vez. Tratei de comprar um impermeável. Devo estar condenada nos dias de trekking, pois já na Patagónia choveu disparatadamente num dos dias.

Ao jantar, no hotel, mulheres vestidas de preto, com véu que não lhes deixava ver a cara, serviam-se no buffet. Ainda não tinha visto, nos hotéis – as mulheres todas tapadas a servirem-se num moderno restaurante. Eu comi arroz e batatas, praticamente, por não gostar da comida e por estar tudo muito picante, mais as duas sobremesas que se vêem nesta foto. Ao menos os doces não me fazem mal.
O hotel estava cheio de turistas, todos indianos, eu era a única estrangeira. A música ambiente também era indiana, diferença notória relativamente a zonas onde existem mais estrangeiros, Jaipur, por exemplo, onde tomei o pequeno-almoço ao som dos U2.
As noites aqui em Munnar foram bastante frias (pelo menos para mim – fariam não mais do que 20 graus [68 fahrenheit]), pelo que dormi toda a noite com o aquecedor ligado. Sim, aqui já há aquecedores. No Rajastão dormia com o ar condicionado a funcionar, aqui são aquecedores. E na casa de banho procurei a água quente para lavar as mãos. Até as garrafas de água que vendem na rua são naturais, raramente têm à venda garrafas de água fresca. Já estou com saudades dos 45 graus do Rajastão…

E entro num novo dia – o dia do trekking – o rapaz da foto abaixo é o guia Senthal (diz-se “Sentil”), que me acompanhou nos dias que estive em Munnar. Um rapaz já viajado que costuma ir à Europa. Esteve em Munique, em Milão, em Veneza. Às vezes arranja patrocínios, empresas que precisam de algum serviço na Europa e lhe pagam as viagens. Tem amigos por todo o mundo. Este é o escritório da sua “empresa turística”, a qual formou com mais dois amigos, salvo erro.

Cemitério hindi, que visitei após muitas insistências minhas, pois estava a ver que me vinha embora da Índia sem nunca ter visto nenhum, quando em qualquer país que visito gosto sempre de conhecer estes aspetos da sua vida. Foi o Senthal que me levou lá de propósito. Era onde estava sepultada a sua avó. Contou-me ele que segundo os ritos fúnebres hindus, estes captam a alma do falecido em algum objeto (um coco, uma lâmpada, uma garrafa de água) e mantêm-na assim durante nove a dezasseis dias, em casa. O corpo já foi enterrado, naturalmente. Encerram então a alma num recipiente de sândalo e deixam-no num templo. Uma vez por mês vão ao templo acender uma vela. Onze meses depois a alma pertence ao deus Vishnu.

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