062 – Na Quinta de Thakur Inder Singh

Novamente momentos de paz e tranquilidade. Deambulei pela quinta, fotografei, observei. Ouviam-se os pássaros, a água a correr, ouviam-se os balidos das ovelhas. Não há nada para fazer, não há pressas. E invade-me uma languidez melíflua, uma moleza indolente, depois da sesta da tarde e com o calor constante. Estou no local ideal para indolências, deambulando neste cenário bucólico.
Se não fossem os cavalos das orelhas espetadas, a tal raça Marwari (ver crónica 57), diria que estava numa quinta do Alentejo. E também a flor de lótus pintada na coelheira… Em quase todos os países da Ásia o lótus é considerado sagrado. Na realidade esta planta é também chamada de lótus-da-Índia e está relacionada com a criação do universo. A pureza representada pela flor ocorre em alusão ao processo da sua germinação, que emerge de águas lodosas para a superfície e quando desabrocha mostra toda a sua beleza e força, abrindo as flores brancas imaculadas.

Eu é que estou capaz de tudo menos de qualquer ação enérgica. Estendi-me na cama indiana – cá a temos, e ficaria ali até ao dia seguinte, estendida, se não me dissessem que temos de regressar ao forte para jantar.

Ainda um assunto sobre o qual não falei até hoje, mas que tem sido permanente desde que cheguei à Índia. O uso de protetor solar. E mais o anti-mosquitos. Ainda não comentei isto, mas tenho uma nota no pequeno bloco que andava comigo, e tenho essa nota no dia de hoje – em Dhamli. Ou seja, hoje destacou-se.
Pois eu colocava protetor solar de manhã, antes de sair do hotel, e renovava depois de almoço. A seguir colocava o anti-mosquitos, cumprindo as instruções do Instituto de Medicina Tropical, onde tive a consulta do viajante antes de partir. A ordem é esta: primeiro o protetor solar, a seguir o anti-mosquitos. E a seguir vem o suor. Agora imaginem o que é andar no campo, com terra, com pó. E com suor. E com protetor solar. E com anti-mosquitos. E para ajudar à festa, os hotéis começaram a dar-me sabonetes de glicerina. Eu pensava que já não me faziam alergia, mas descobri que sim, que continuam a provocar-me uma borbulhagem miúda por todo o corpo.
É preciso ter estofo para estas coisas. Uma pessoa mais piegas, que goste de andar sempre fresca e não-peganhenta, como é suposto, não pode meter-se numa viagem destas. Eu chegava ao final do dia e estava da cor dos indianos. Já a começar também a ficar bronzeada pelo sol intenso dos dias. Se alguém me tocasse, deveria ficar colado a mim. E agora cheia de borbulhinhas miúdas. Coitados dos indianos, até deviam ter medo de mim. Mais adiante veremos algumas fotos minhas em que eu estou perfeitamente mascarrada – de terra, de suor, de protetor solar e mais o spray dos mosquitos. (Vá lá, levei spray, se levasse gel era o fim da picada…) (que engraçado, quem inventou esta expressão “fim da picada” devia estar na mesma situação que eu, a usar um anti-mosquitos…)

É preciso é descontração. Ando todos os dias lavada e perfumada na Europa, deixem-me andar suja e peganhenta nos campos da Índia, em férias.

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