034 – De Bicicleta pela Floresta de Loré
Esta é a maior floresta costeira existente em toda a ilha de Timor. Recordo que Loré faz parte do Parque Nacional Nino Konis Santana (detalhe na crónica 18). Esta área é caracterizada por florestas tropicais secas, florestas de manguezais e pastagens costeiras. Aqui há teca, sândalo e bambu. A população também cultiva arroz nesta região. Como fica longe dos centros populacionais e é de difícil acesso, a natureza aqui ainda está praticamente intocada.¹
Ruínas do tempo dos portugueses, os primeiros europeus que chegaram a esta região. Aqui era a antiga alfândega.
Esta construção está junto às ruínas do edifício da alfândega e servia para amarrar as cordas das barcaças e demais barcos que aqui aportavam para descarregar mantimentos.
A única foto que consegui apanhar dum búfalo selvagem. Eram uns três ou quatro e fugiram espavoridos mal se aperceberam da minha aproximação na bicicleta (eu tenho o guia Daniel atrás de mim).
Aqui temos o fruto da árvore Ai Nitas (Sterculia Foetida), árvore existente no Sudeste da Ásia e também em África. A palavra “Sterculia” vem do deus romano Sterquilinus, que era o deus do fertilizante ou adubo². “Stercus”, em latim, significa “fertilizante” ou “estrume”. Sterquilinius era o deus do esterco, portanto. Que deus tão agradável, este. Bom, e “Foetida” significa “fétido”, “fedorento”.
Citando o blog de Augusto Joaquim de Carvalho Lança, o qual foi Professor na Faculdade de Agricultura da Universidade Nacional de Timor Lorosa’e, em Díli:
A Ai Nitas é uma árvore da flora de Timor-Leste. A parte mais interessante e curiosa desta planta encontra-se nos seus frutos. Quando ainda verdes assemelham-se a um porta-moedas fechado. Quando o fruto amadurece abre e mostra um interior inesperado. Um tecido fortemente tingido de vermelho envolve um conjunto de sementes ovais e castanhas. Trata-se de uma árvore tropical, de folha caduca na época seca, e que aparece um pouco por todo o lado em Timor, menos nas terras mais altas e frias. É planta de grande valor ecológico, pois sendo autóctone de Timor está perfeitamente integrada nos habitats onde se desenvolve. Deve pois ser cultivada nas zonas erodidas e em todas aquelas onde se pretenda recuperar a floresta natural timorense. A Missão Agrícola portuguesa tem distribuído milhares de Ai Nitas pelos agricultores.
As suas sementes são tóxicas quando cruas mas comestíveis depois de assadas. Têm bastante óleo e a ação do calor dá-lhes um sabor muito agradável. Na Indonésia extrai-se este óleo que tem utilizações industriais (óleo de kelumpang) e alimentares.
As folhas são uma boa fonte de proteína, cálcio e fósforo para os ruminantes. Na estação seca as folhas caídas poderão ser uma boa ajuda na alimentação do gado.
A madeira da Ai Nitas é leve e só pode usar-se no interior das casas pois quando exposta à chuva apodrece rapidamente.
O nome da planta indica que uma das suas principais características é o odor desagradável que os seus tecidos libertam. No Brasil a árvore foi introduzida como ornamental e é conhecida como chichá-fedorento³.
O fruto da árvore Ai Nitas (Sterculia Foetida). Em inglês chama-se “Tropical Chestnut”. E enfim, a mim não me cheirou mal.
Lianas, uma planta trepadeira que sobe pela árvore em busca de luz.
Uma fonte construída no tempo do colonialismo português, aparentemente em 1924, segundo está escrito nela.
Não faço ideia o que é isto, mas fotografo tudo. Sou o Sherlock Holmes das florestas tropicais.
Cocos e crâneos de animais. Aqui será um cabana de caçadores.
O pequeno crâneo ao centro é de um macaco. Aqui existem macacos, mas extremamente difíceis de avistar.
Árvore Kenari Canarium. Na crónica anterior também aparece uma. Há muitas espécies de árvores Canarium. Esta será talvez a Canarium Ovatum. Ou Canarium Indicum. Também é conhecida por “Árvore Pili” – e daqui o nome dado às suas nozes: Nozes de Pili. É uma árvore tropical e subtropical existente no sudeste da Ásia e também em África. Gosta de temperaturas quentes e chuvas bem distribuídas. Não tolera a menor geada ou baixa temperatura. As árvores maduras podem resistir a ventos fortes e até a tufões. As nozes da Canarium são comestíveis e daqui a pouco vou provar uma.
O produto mais importante da árvore Kenari Canarium é o miolo das suas nozes, chamadas Nozes de Pili, ou Nozes de Kenari. Provei uma, o sabor e a textura são semelhantes aos da amêndoa. Deixo a informação retirada do World Agroforestry Centre sobre estas Nozes de Pili:
Quando cru, o seu sabor assemelha-se a sementes de abóbora assadas e, quando assado, o seu sabor é suave, semelhante a nozes, e a sua textura é tenra e crocante, superior à da amêndoa. As Nozes de Pili também são usadas para fazer chocolate, sorvetes e assados. Nutricionalmente, o núcleo contém 71,1% de gordura, 11,4% de proteína e 8,4% de carboidratos; é rico em cálcio, fósforo e potássio. Os brotos jovens da árvore são usados em saladas, e a polpa de Pili cozida lembra a batata-doce na textura, é oleosa (cerca de 12%) e é considerada como tendo valor alimentar semelhante ao do abacate. O óleo da polpa de Pili pode ser usado para cozinhar. É um óleo amarelo claro, comparável em qualidade ao azeite, contendo até 59% de glicéridos oleicos e 32-59% de glicéridos palmíticos. O óleo da Noz de Pili pode ser extraído e utilizado como substituto do óleo de semente de algodão no fabrico de sabão e produtos comestíveis.
Como combustível, a casca dura e grossa que envolve as nozes de Pili faz um excelente combustível para cozinhar. A madeira rica em resina faz boa lenha. A resina valiosa, chamada “Manila elemi” ou “breabianca”, é usada como ingrediente no fabrico de plásticos, tintas de impressão e perfumes. Também é usada pelos espanhóis para reparos navais.
A nível de usos medicinais, a resina é macia, com odor, e tem a textura do mel. Antigamente era exportada para uso farmacêutico europeu como “Manila” ou “Philippine Gum Elemi” e a partir dela preparava-se um unguento para curar feridas e também pensos.
As castanhas cruas são um purgante⁴.
Ocorrência da árvore Kenari Canarium.
Foto retirada de: https://bie.ala.org.au/species/http://id.biodiversity.org.au/node/apni/2918714
¹ “Loré I” (s.d.). Wikipedia. Página consultada a 22 Outubro 2018,
<https://de.wikipedia.org/wiki/Lore_I>
² “Sterculia foetida” (s.d.). Wikipedia. Página consultada a 22 Outubro 2018,
<https://en.wikipedia.org/wiki/Sterculia_foetida>
³ Lança, Augusto Joaquim de Carvalho (2011, 17 Julho), “Ai nitas (Sterculia foetida)”. Timor Agrícola. Página consultada a 22 Outubro 2018,
<http://timor-agricola.blogspot.com/2011/07/ai-nitas-sterculia-foetida.html>
⁴ Orwa et al. (2009) “Canarium ovatum; Engl. Burseraceae”. World Agroforestry Centre – International Centre for Research in Agroforestry (ICRAF). Página consultada a 22 Outubro 2018,
<http://www.worldagroforestry.org/treedb/AFTPDFS/Canarium_ovatum.PDF>