061 – Corvo – A Caminho do Morro dos Homens

Já estou a subir pelo lado esquerdo do Caldeirão. Hoje de manhã subi ali por aquela estrada – pelo lado direito do Caldeirão.

Mas estas turfeiras – estas fofuras brancas – dificultam o caminho. O João já me tinha avisado. Disse-me que uma pessoa se afunda a andar em cima disto. E aqui nesta foto está-se bastante bem: o pé esquerdo desaparece apenas um pouco. O pior que acontece – e está constantemente a acontecer – é existirem buracos muito fundos, até à coxa, no meio das ervas escondidos. Fico com uma perna de fora e outra perna completamente metida no buraco muito estreito. Nem vejo o buraco, nem vejo a perna – ela simplesmente desaparece e eu caio. Acho que isto também tem uma boa dose psicológica: a perna desaparecer por completo dentro dum buraco que não vejo, com a vegetação toda fechada à volta dela, faz muita confusão. Sei lá o que está ali no fundo. Até pode estar um morto-vivo que vai puxar-me a perna, eu não vejo nada! Como é que existe um buraco tão estreito e tão fundo, onde cabe a minha perna, e ela desaparece?! E eu caio, claro, a perna que fica de fora não tem alternativa senão dobrar-se, para conseguir acompanhar a outra.
As limitações dos bípedes humanos, já me tinha avisado o melro também.

E todo o caminho é feito de turfeiras. É incrível. Estas fofuras brancas que parecem tão suaves – o paraíso da fofura – e que afinal é uma rasteira para os limitados bípedes humanos. E é mesmo só para os humanos, porque numa foto abaixo eu vou mostrar duas vacas a andarem com toda a descontração em cima disto. 200 ou 300 kg de peso, e aí vão elas. Eu, com os meus miseráveis 55 kg, afundo-me constantemente.

Já cheguei aqui, porém não vou andar mais. Vou voltar para trás (enterrando-me novamente uma dúzia de vezes) e vou ao Morro dos Homens pela parte de fora da cratera.

Cá estão elas. É mesmo intrigante. Mas elas não se enterram porquê? Uma delas até se deitou, nestas fofuras brancas.

A ilha das Flores, lá ao fundo.

Pois subi a pé, esta parte.

Já estive aqui, na crónica 50. Era onde estava o bezerro morto.

E já fiz este caminho a pé. Como me dá muito mais prazer ir agora de bicicleta.

Curiosamente passou aquela carrinha vermelha por mim. Lá vai aparecendo gente de vez em quando. As vacas andam por aqui, e os donos vêm vê-las e tratar do que há a tratar. Mas o carro irá embora rapidamente, irá passar novamente por mim em sentido contrário. Cumprimentámo-nos com um aceno, eu e o condutor, que não conheço.

– Vais ver o Grande Senhor, Rute? Não desististe ainda?
– Não desisto, vaquinha.
– Então segue o teu caminho, a partir daqui não é difícil.
– Há fofuras brancas por aqui, vaquinha?
– Sim, bastantes lá em cima. Nas tuas limitações de bípede humana terás algumas dificuldades, mas lá chegarás.
– Obrigada vaquinha. Adeus, vive bem.

Eis o Morro dos Homens – é o pico do meio, o mais alto. E lá em cima, aquela parte mais clara, são mesmo fofuras brancas. Turfeiras. Vai ser lindo. Vou desaparecer num buraco e ninguém mais me encontrará.

Parece que está ali tão perto, não é? Mas está a 1 km de distância. E ali no tracejado cinzento, não existe caminho, claro. Salve-se quem puder.

São 13h52. Qual almoço qual carapuça. A bicicleta fica aqui presa com o cadeado, e eu inicio a caminhada.

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